segunda-feira, 19 de julho de 2010



O Ministro Paulo Vanucchi profere palestra em Bauru sobre o Plano Nacional de Direitos Humanos hoje, 19 de julho, às 19:30h, no auditório da OAB. A palestra abre a Exposição Fotográfica "Direito à memória e à verdade: a ditadura no Brasil - 1964-1985". (clique na imagem para ampliar)
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quinta-feira, 24 de junho de 2010

Promotor da Infância e Juventude emite parecer contrário ao toque de recolher!

Jornal da Cidade - 24/06/2010

Promotor é contra toque de recolher

Lucas Pimentel emitiu, ontem, parecer contrário ao pedido feito recentemente em audiência; juiz dará palavra final

por Tisa Moraes

O promotor da Infância e Juventude, Lucas Pimentel de Oliveira, emitiu, ontem, parecer contrário ao pedido de implantação do toque de recolher em Bauru. Ainda hoje, a manifestação será enviada ao juiz da Vara da Infância e Juventude, Ubirajara Maintinguer, que irá tomar a decisão final sobre o tema, o que deverá ocorrer dentro dos próximos dez dias.

A proposta foi apresentada no início de abril pelo comandante do 4º Batalhão da Polícia Militar do Interior (4º BPMI), tenente-coronel Nelson Garcia Filho. Ele sugere a proibição da presença de menores de 18 anos nas vias públicas e estabelecimentos comerciais de segunda a sexta-feira, depois das 23h, e aos sábados, domingos e feriados, após a meia-noite. O principal objetivo seria deter a criminalidade juvenil e proteger os jovens de perigos como o crack, que já se tornou questão de saúde pública.

A iniciativa foi discutida amplamente nos meses que se seguiram, principalmente entre os órgãos e instituições de defesa dos direitos da criança e do adolescente. No final de maio, Maintinguer promoveu uma audiência pública para que ele e o Ministério Público (MP) tomassem conhecimento do debate gerado pelos representantes da área.

Desde o início, entidades como o Conselho Tutelar, Conselho Municipal dos Direitos da Criança, Secretaria Municipal do Bem-Estar Social (Sebes), Conselho Regional de Psicologia (CRP), Polícia Civil e Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) se manifestaram contra a adoção da medida. E esse posicionamento, segundo Pimentel, pesou em sua manifestação contrária ao projeto.

“Não há uma legitimação social para a proposta, na medida em que não tem o apoio dos segmentos constituídos. Na audiência pública, além da Polícia Militar, apenas dois Consegs (Conselhos Comunitários de Segurança) foram favoráveis.”

De acordo com o promotor, o toque de recolher fere alguns dispositivos da Constituição Federal, dentre eles a dignidade da pessoa humana e os direitos de locomoção e reunião. “E a Constituição só permite a restrição desses direitos nos denominados estados de defesa e sítio. No meu modo de ver, não teria como o juiz determinar essa limitação por uma norma geral, que atinge a todos os adolescentes indistintamente”, aponta.

Os artigos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) relacionados ao direito à convivência comunitária também foram considerados por Pimentel. “Se o adolescente não pode sair na rua em determinados dias e horários, não poderia brincar ou interagir com os seus pares na frente de casa.”


‘Ineficaz’

Afora todos os entraves legais para que o toque de recolher possa ser aplicado, o promotor afirma ainda que a medida, por si só, é ineficaz como estratégia para combater o consumo de álcool e drogas, assim como controlar o aliciamento de jovens para o tráfico e a prostituição. Para ele, estes são problemas que precisam ser enfrentados de forma ampla, com o desenvolvimento de políticas públicas que envolvam os segmentos políticos e sociais responsáveis.

“Não podemos trancar esses adolescentes em suas casas. Não podemos presumir que em todo lugar, a todo momento, haverá um bandido querendo pegas as crianças e adolescentes. A obrigação de criar, orientar e impor limites aos filhos é dos pais, sem a interferência, num primeiro momento, do Poder Judiciário”, frisa.

Embora o parecer do promotor seja importante para nortear a decisão do juiz da Vara da Infância e Juventude, o tenente-coronel Garcia ainda tem esperanças de que o toque de recolher possa ser adotado em Bauru. Mesmo que a proposta inicial não seja aceita, ele acredita que algumas modificações nas regras sugeridas possam aumentar as chances de a iniciativa ser posta em prática.

“Poderia, por exemplo, estender o horário (aos sábados, domingos e feriados) para as 2h. Ainda acho que a aprovação é possível, principalmente se dermos voz aos pais de crianças e adolescentes, que em sua maioria apoiam a proposta, mas que tiveram pouca oportunidade de serem ouvidos neste processo”, pondera.
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segunda-feira, 21 de junho de 2010

GVVDH prestigia Cooperifa no SESC Bauru

Integrantes do Grupo contra a Violência e Violação de Direitos Humanos de Bauru prestigiaram na última quinta-feira, 17 de junho, a apresentação da COOPERIFA - Cooperativa de Cultura da Periferia no SESC Bauru.

A COOPERIFA foi criada em 2001 pelo poeta Sérgio Vaz e promove todas as quartas-feiras, em um bar do bairro Piraporinha, extremo sul da cidade de São Paulo, um Sarau em que dezenas de pessoas se reúnem para declamar textos próprios ou de autores consagrados. Quinzenamente é também realizado o projeto Cinema da Laje, que exibe filmes e documentários de todas as partes do Brasil e do mundo.

Sérgio Vaz, Márcio, Jairo, Luciana e Will brindaram os bauruenses com poesias belíssimas... provocativas, divertidas, reflexivas. Um delicioso e inesquecível espetáculo, que acabou proporcionando um grande encontro entre "cooperiféricos" e militantes de Direitos Humanos que descobriram uma incrível afinidade, sintonia e identificação por comungarem a visão de homem e de mundo e os ideias de luta.

Que esse seja o primeiro de muitos encontros!

Grande abraço e nosso muito obrigado aos amigos da COOPERIFA.



A COOPERIFA nas palavras de Sérgio Vaz:

A Cooperifa é um movimento cultural de/ para periferia. É um movimento cultural realizado e pensado sob a benção da comunidade. A Periferia é, e sempre será o motivo da nossa luta, da nossa perseverança. É um movimento criado para icentivar a leitura e a criação poética. Para pessoas que nunca tiveram contato com os livros, com a poesia. Não é um movimento de intelectuais de subúrbio, para a masturbação literária. Nem tampouco o suprasumo dos movimentos culturais que existem felizmente, aos montes, no Brasil. Ao contrário do que muitos pensam, a Cooperifa não é um movimento contra qualquer coisa que exista, seja do centro, seja de classe ou de cor, é um movimento a favor da periferia. Um movimento em prol das pessoas da quebrada, e de tantas outras que se espalham pelo país. É um movimento a favor do ser humano, do cidadão, do trabalhador, da mulher, do analfabeto, dos sem-palco, e por aí vai.

Sérgio Vaz
07 de junho de 2007, www.colecionadordepedras1.blogspot.com.
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sexta-feira, 18 de junho de 2010

Pais de Jorginho questionam desclassificação de homicídio doloso

17/06/2010  - Jornal da Cidade


Pai de mecânico contesta decisão de juiz

Família vai ao TJ e quetiona decisão que desclassificou acusação de homicídio doloso contra ex-policiais militares

Da Redação

A família do mecânico Jorge Luiz Lourenço, morto por policiais militares em abril de 2007, recorrerá ao Tribunal de Justiça (TJ), em São Paulo, na esperança de reverter a decisão do juiz Benedito Antônio Okuno, da 1ª Vara Criminal de Bauru. O magistrado bauruense, acompanhando parecer do Ministério Público Estadual (MPE), desclassificou a acusação de homicídio doloso (intencional) contra os ex-policiais Lincoln César Cares, Renato Valderramas de Favari e Ricardo Antônio do Amaral.

Dessa forma, os três não serão encaminhados ao Júri Popular para responder às acusações de homicídio e fraude processual. Na última sexta-feira, os advogados da família protocolaram no TJ a apelação para que a sentença de Okuno seja reformada.

Em nota enviada à imprensa, Jorge Lourenço e Edite Francisquini Lourenço, pais do mecânico, afirmam: “Para nós, há provas no processo que demonstram que os três policiais, expulsos pela PM, tiveram intenção de matar nosso filho, com apenas 22 anos de idade na época (sic).”

No texto, Jorge e Edite fazem questão de frisar que o filho “era trabalhador, honesto e não usava drogas”. Na época, o mecânico Jorginho chegou figurar como suspeito de uma suposta tentativa de fuga ocorrida no Instituto Penal Agrícola (IPA) de Bauru, versão que nunca chegou a ser confirmada.

Os policiais envolvidos na morte de Jorge Lourenço afirmam ter encontrado uma pedra de crack em um de seus bolsos. Os PMs também alegaram que o mecânico estava armado e atirou contra eles, razão pela qual se viram obrigados a revidar. Marcas de chumbo (semelhantes a esfregaços) chegaram a ser encontradas na mão direita do rapaz, que era canhoto.

A família acusa os policiais de haverem fraudado a cena do crime. Os pais de Lourenço também consideram inaceitável a tese de homicídio culposo (quando não há intenção de matar), uma vez que, segundo o próprio processo, os PMs efetuaram dez disparos contra a vítima. “Jamais se pode afirmar que quem dá dez tiros em alguém não tem a intenção de matar”, afirmam, na nota.
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Ministro Paulo Vanucchi visita Bauru

O Ministro Paulo Vanucchi, titular da Secretaria Especial de Direitos Humanos, virá a Bauru no próximo dia 01 de julho/2010.
Vanucchi realizará palestra sobre o Plano Nacional de Direitos Humanos no auditório da OAB às 19:00h. Não perca!!

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quarta-feira, 16 de junho de 2010

Moção de Repúdio ao Estatuto do Nascituro

16 de junho de 2010

Conheça a moção de repúdio ao projeto do Estatuto do Nascituro divulgada pela Marcha Mundial das Mulheres:


Moção de Repúdio ao Estatuto do Nascituro

A Marcha Mundial das Mulheres repudia com indignação o Projeto de Lei (PL) de autoria do Deputado Luiz Bassuma (PV-BA) e Miguel Martini (PHS-MG), que propõe instituir o Estatuto do Nascituro. O PL passa a considerar sujeito pleno de direito o óvulo fecundado, ou seja, o concebido e não nascido passa a ter mais direitos do que a mulher.

Tal PL pretende ainda legalizar, a violência sexual, especialmente o estupro que sofrem as mulheres. Tornando inadmissível o aborto conseqüente desta violação e instituindo o pagamento de auxilio para sustentação do nascido até os 18 anos. A “Bolsa Estupro”, como é conhecida pelos movimentos de mulheres, reforçará que a punição recairá sobre a própria mulher. A bolsa terá que ser paga pelo agressor e caso não o faça o ônus recairá sobre o Estado.

Afora a hipocrisia, se destaca a pretensão do legislador em querer determinar quando começa a vida, coisa que nem a ciência ousou fazer. Ao analisar os dispositivos desta proposta cai por terra o discurso de “proteção da vida”, pois não se vê nada além do que já tratam as legislações vigentes, sobre direitos de personalidade, direito de saúde e patrimoniais dos recém nascidos.

Caso aprovado fica proibido ainda qualquer manifestação que trate do assunto Aborto, cerceando o direito do debate quesito fundamental na democracia.

Entendemos que a proposta do “Estatuto do nascituro” deve ser rechaçada, pois ela significa mais um dos ataques dos conservadores, machistas e opressores:

- Condena as mulheres à submissão, mantendo-as expostas à violência;

- Reflete a omissão do legislativo diante do aborto como elemento de preservação da vida das mulheres e de garantia da autonomia;

- Golpeia a democracia, a igualdade e a justiça, atingindo bens e valores construídos historicamente.

O avanço rumo à aprovação do chamado “Estatuto do Nascituro”, deve ser visto como ameaça aos direitos das mulheres. Nele, estão reunidas as pautas mais retrogradas e de submissão, ostentadas pelo patriarcado e as instituições que o perpetuam, ao longo dos séculos: controle sobre o corpo das mulheres, a institucionalização da violência sexual e o domínio sobre o destino das mulheres.

Direito ao nosso corpo. Legalizar o aborto!

Marcharemos até que todas sejamos inteiramente LIVRES!

MARCHA MUNDIAL DAS MULHERES

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Coluna "Opinião" do Jornal da Cidade de hoje, 09/06/2010, traz um texto de autoria do professor universitário, advogado, ex-delegado de Polícia de Bauru e Promotor de Justiça Aposentado ALFREDO ENEIAS GONÇALVES D' ABRIL discutindo o Toque de Recolher.

O autor se posiciona contrariamente à medida, considerando-a uma expressão do conformismo de uma sociedade que quase nada faz para combater efetivamente os problemas que assolam a juventude.


09/06/2010 - Opinião

Toque de recolher

Não há dúvida que o toque de recolher em estudo para sua eventual implantação nesta cidade, nos moldes estabelecidos em algumas comarcas, impede o exercício do direito individual do menor. Impor essa restrição contraria a Constituição da República, assim como regras escritas bem contundentes do Estatuto da Criança e do Adolescente. Também não se duvida que o Estatuto especificamente cuida dos menores infratores e dos menores não infratores desamparados pelos pais, com previsão para serem colocados nos abrigos de instituições do Estado ou particulares, ainda em família substituta, aguardando solução judicial de seus futuros.

É o toque de recolher uma restrição totalitarista repaginada para solucionar um acontecimento social novo. Tem basicamente por finalidade, a retirada de menores das vias públicas pelo policiamento ostensivo quando desacompanhados dos pais ou responsáveis se encontrarem vagando pelas ruas após determinado horário noturno. A justificativa dessa medida arbitrária e ultrapassada está na presunção de que os menores pilhados depois do horário de recolhimento, permanecem nas ruas articulando a prática de furtos ou entregando-se ao consumo de drogas. À míngua de previsão da lei proibindo esse tipo de comportamento do menor é de mediana conclusão que a prática do toque de recolher será uma investida caprichosa da polícia a pretexto de ver nesse quadro indícios ou mera suposição como prognóstico que um delito ou ato de vandalismo prestes a eclodir, situações anti-sociais que, antes de mais nada, colocarão em infringência à ordem legal a autoridade editora daquela providência e policiais que cumprirem a ordem.

O fato baseado em elementos realísticos, expostos com firmeza de propósito, e que por isso reclama solução a curto prazo, mobilizou grande público interessado no resultado de um encontro ocorrido no auditório da Ordem dos Advogados do Brasil, desta cidade, no final do último mês, onde o debate dividiu as opiniões, contando com o subsídio de muitos argumentos. Todos eles serão sopesados para que a autoridade judiciária competente decida a tormentosa e polêmica questão.

A prática de delitos por menores e o consumo de drogas, verdadeiros flagelos urbanos transformados em ações rotineiras, teve por origem não muito remota o descaso do Estado no empenho ao combate do problema na sua gênese, ou mesmo depois de dilargado, evitando a incontrolável disseminação ao impedir que se tornasse um tormento para toda sociedade organizada. Quase nada se faz na tentativa de expungir esse mal e por tal comodismo é que a sociedade se viu colocada em estado de necessidade esforçando-se para ocupar o ranking da primeira de duas posições: 1.ª) proteger a própria pele de iminente perigo oferecido pelas gangs de menores badernando nas noites; 2.ª) condescender-se por fugir de seu alcance o salvamento dos menores do vício das drogas pela impossibilidade de fazer as vezes do Estado a fim de remover esse mal confiante no milagre da ressocialização.

A iniciativa popular e o interesse demonstrado pelas autoridades na procura de um caminho que reduza essa anomalia é de todo louvável, deixando como bom e cívico exemplo que um fato social grave e descuidado por quem deve administrá-lo e que tem como vítima as duas pontas do problema – sociedade organizada e menores – não poderá mais crescer sem enfrentamento. Inconformada com a omissão estatal a sociedade deseja aplicar o estímulo que tem para suprir esse descaso usando os meios de seu alcance. Se não há lei para resolver a questão da sociedade aflita, atemorizada, mas com piedade do triste destino reservado aos jovens desfavorecidos, afinal, parcelas de seu corpo social, qualquer iniciativa que venha suavizar esse tormento, ainda que seja sem a previsão legal, porém, com a boa intenção de tapar aquele buraco é bem-vinda.

A aglutinação da sociedade merece aplausos e o indispensável apoio da parte policial podem levar a normatividade da questão pela autoridade judiciária. Mas como o problema é polêmico, se implementado o toque de recolher, além de surgirem regras de direito de modo não ortodoxo, aparece um obstáculo de difícil execução: para onde serão encaminhados os jovens apreendidos supostamente planejando atos criminosos ou de vandalismo e os alimentários do vício? Não há lugar apropriado para o recolhimento deles o que faz mais difícil a viabilidade do assunto vingar-se pela deliberação popular.

O autor, Alfredo Enéias Gonçalves d’Abril, é professor universitário

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Conselho da Comunidade Negra manifesta posição contrária ao Toque de Recolher

O Conselho da Comunidade Negra manifestou sua posição contrária à implantação do Toque de Recolher na cidade de Bauru em carta publicada na Tribuna do Leitor do Jornal da Cidade. Confira:

04/06/2010 - Cartas

TOQUE DE RECOLHER

Está em discussão na cidade de Bauru uma medida chamada de “Toque de Recolher”, cuja idéia é impedir que jovens com menos de 18 anos fiquem na rua depois de determinado horário. A idéia está sendo debatida entre os setores organizados da sociedade civil e amplamente veiculada pela imprensa local. Nós do Conselho Municipal da Comunidade Negra de Bauru, entendemos que o Toque de Recolher não resolverá os problemas de segurança em nossa cidade e, ao invés disso, irá causar sérios problemas para a juventude Bauruense, principalmente à sua parcela pertencente aos extratos mais populares.

Nosso Conselho, em seu compromisso com os direitos da juventude, repudia veementemente a tentativa de instituir o toque de recolher em Bauru. Entendemos que essa medida pune os jovens por uma situação da qual eles são as principais vítimas. Restringir a liberdade de um indivíduo, partindo do pressuposto de que ele pode cometer uma infração, é uma arbitrariedade e atenta contra a Constituição que prevê a liberdade de ir e vir a todos os cidadãos. Salientamos ainda que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) estabelece no seu artigo 106 a privação de liberdade somente ao adolescente que for flagrado no ato da infração. Portanto, essa medida é ineficaz, conforme constatação do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente – CONDECA – em relação à experiência realizada na cidade de Ilha Solteira (SP), local onde o toque de recolher foi implantado, porém está em vias de extinção, pois mesmo após um ano, a medida se apresenta como “falha, punitiva e insuficiente”, conforme matéria do Jornal da Cidade de 20 de abril de 2010, pagina 19.

Entendemos também que é um grande equívoco responsabilizar o adolescente pela incompetência do Estado brasileiro na garantia dos seus direitos fundamentais. Não existe uma propensão natural da juventude ao crime. Não podemos também aceitar o falso argumento de que o toque de recolher irá proteger o jovem, privando-o de estar sujeito a situações de violência risco. Ora, o Estado deve, antes de qualquer coisa, eliminar as situações de violência e risco que assolam a população, ao invés de proibir parte da população, no caso a juventude, a se expor diante de tais situações. O combate à violência não pode se apegar apenas a números é preciso pensar também na formação dos jovens. Como será a formação de uma geração proibida de ter vida social noturna?

A questão da delinqüência juvenil está nas condições degradante a qual a maior parte dos jovens infratores é submetida ao longo de sua vida: miséria material e espiritual, ambientes insalubres, acesso aos serviços básicos de baixa qualidade como educação e saúde e presença constante da criminalidade.

Uma análise apurada de nossa cidade pode constatar que faltam opções de lazer para a juventude. Não há eventos constantes destinados aos jovens e os locais de lazer concentram-se majoritariamente em uma única região da Cidade, que é a Zona Sul. O centro de Bauru, assim como seus bairros não contam com áreas de lazer, shows e outros tipos de entretenimento de massa. Assim, a juventude é obrigada a se deslocar até a zona sul em busca do lazer e divertimento, que é um direito seu. Propomos, portanto, como alternativa a este quadro as seguintes propostas:

1) A promoção de eventos artísticos, esportivos e culturais de massa nos bairros periféricos no período noturno e aos finais de semana, utilizando as estruturas existentes dos Estádios Distritais, quadras de escolas e Ginásios de Esportes; 2) A revitalização do centro da cidade de Bauru, principalmente a Praça Rui Barbosa, com apresentações musicais e outras atividades similares durante a noite aos fins de semana; 3) O melhor aproveitamento do Teatro Municipal, com eventos, apresentações, exposições e shows acessíveis a população de baixa renda;

4) O incentivo a cines-clube, com a exibição de filmes grátis para a população, utilizando-se os espaços adequados para tanto, ou adaptando espaços para esta finalidade, como o Automóvel Clube, o Museu da Imagem e do Som, o Museu Ferroviário, os auditórios de sindicatos e clubes, as associações de moradores, igrejas, escolas, etc. 5) Aumentar os orçamentos das secretarias de Cultura e Esporte e Lazer para que as mesmas tenham condições para dar sustentação às propostas aqui apresentadas, por meio de monitores qualificados para tanto. Por fim, manifestamos, desde já, nosso repúdio ao toque de recolher e à tentativa de reduzir a maioridade penal. Medidas estas que são na verdade tentativas de criminalizar a Juventude.

Conselho Municipal da Comunidade Negra de Bauru

sexta-feira, 4 de junho de 2010

Desclassificação do crime de homicídio doloso no Caso Jorginho gera indignação

O GVVDH repudia a desclassificação do crime de homicídio doloso no caso Jorginho!

Conforme reportagem abaixo, a desclassificação teria se baseado no argumento de que não há comprovações de que os policiais tenham nem mesmo assumido o risco de matar ao efetuar os disparos na direção do rapaz, o que configuraria ao menos dolo eventual.

Como se sabe, contudo, o mecânico Jorge Luiz Lourenço foi morto com nove tiros disparados pelas costas, tendo um deles atingido a cabeça.

Além dos tiros, é preciso lembrar que o local do crime foi alterado, na tentativa de simular que o jovem estava com uma arma na mão direita, o que não se comprovou, já que Jorginho era canhoto.

O GVVDH realizou o ato de protesto "Justiça para o caso Jorginho" no dia 25 de fevereiro de 2010 em frente ao Fórum da cidade, manifestando-se contrário à possibilidade de que o caso não vá a juri popular. Na ocasião foram distribuídos à população panfletos com os seguintes dizeres:

Jorginho foi assassinado no dia 05 de abril de 2007 após furar um bloqueio policial quando voltava do trabalho para casa. Nove tiros foram disparados contra Jorginho. Um deles atingiu a cabeça.
Ficou comprovado que a cena do crime foi modificada: uma arma foi colocada na mão direita de Jorginho para acusá-lo falsamente de estar armado e ter entrado em confronto com a polícia. Mas a mentira não foi longe: Jorginho era canhoto.

Os policiais envolvidos foram expulsos da Corporação. Mas agora o Promotor requeriu a desclassificação do crime de homicídio doloso para culposo. Isso significa que não teria havido intenção de matar. Mas, pense nisso: quem atira nove vezes pelas costas não tem intenção de matar?

Confira a reportagem publicada no Jornal da Cidade noticiando a desclassificação:

01/06/2010 - Polícia

‘Caso Jorginho’ não irá a júri popular

Em sentença publicada ontem, juiz da 1.ª Vara Criminal diz que morte de mecânico não configura homicídio doloso

Tisa Moraes e Ieda Rodrigues Com Redação



Em sentença publicada ontem, o juiz de direito da 1ª Vara Criminal de Bauru, Benedito Antônio Okuno, decidiu pela desclassificação do crime de homicídio doloso no caso da morte do mecânico Jorge Luiz Lourenço, o Jorginho. Ele foi baleado durante perseguição da Polícia Militar (PM) ocorrida em abril de 2007, no Núcleo Mary Dota.

Com isso, os réus, os então policiais militares Lincoln César Cares, Renato Valderramas De Favari e Ricardo Antônio do Amaral, não deverão ser mais levados a júri popular. Embora Okuno não tenha especificado por qual crime os acusados serão julgados, especialistas consultados pelo JC acreditam que eles deverão responder por homicídio culposo (sem intenção de matar), cuja pena não ultrapassa três anos de detenção, se não for considerada nenhuma circunstância agravante.

Ainda de acordo com essas fontes, com a decisão, o processo deverá ser novamente distribuído para uma das quatro varas criminais de Bauru. Mais uma vez, o juiz a se encarregar do caso deverá pedir nova manifestação do Ministério Público e só então poderá tipificar o crime e decidir qual a pena a ser aplicada.

Ele também terá de considerar o recurso da acusação, já que a família de Lourenço adiantou que pedirá para que a decisão seja reformada. Já os advogados de defesa esperam que o processo possa ser julgado no Tribunal de Justiça Militar, mas a reportagem apurou que a probabilidade de que essa mudança ocorra é praticamente nula.

A decisão do juiz da 1ª Vara Criminal foi baseada na consideração final do Ministério Público (MP) - que em fevereiro, solicitou que o policiais envolvidos no processos respondessem por homicídio culposo - e também nos depoimentos de testemunhas e peritos. Inicialmente, no entanto, o caso havia sido denunciado como homicídio doloso, já que Lourenço supostamente estaria desarmado e não teria tido oportunidade de defesa.

Mas a sentença assinada por Okuno concordou com a avaliação do promotor Djalma Marinho Cunha Filho de que não há comprovações nem de que os policiais tenham assumido o risco de matar ao efetuar os disparos na direção do rapaz. Mesmo se isso tivesse acontecido, a Promotoria não poderia afirmar que agiram em conjunto e nem com dolo eventual, já que não foi possível determinar quem foi o autor do disparo fatal.

“Somente aquele que atingiu a vítima poderia ter agido com dolo eventual. Com a autoria incerta, não há como fundamentar a pronúncia de todos os réus”, escreveu o juiz. “O dolo eventual consiste em assumir o risco de produzir o resultado, mas quem está em serviço, praticando atos típicos de seu trabalho, age com dolo eventual? Salvo melhor juízo, entendo que não”, acrescentou.


'Provocação da vítima'

Na sentença, o juiz Benedito Okuno afirma que ficou evidente que os acusados pelo crime não tiveram intenção de matar e efetuaram os disparos “por provocação da vítima, em razão de sua fuga”, na tentativa de intimidar Jorge Luiz Lourenço. Defendeu também que os policiais estavam em serviço e que, diante do ocorrido, era dever legal deles “agir e atirar”.

Para ele, quem assumiu o risco de ser morto foi o próprio mecânico, que fugiu “de forma cinematográfica”. O juiz lembra que, no dia do homicídio, ficou constatado que houve fuga de presos do Instituto Penal Agrícola (IPA), na qual os detentos tiveram auxílio de motociclistas. Dentro desse contexto, Lincoln, Amaral e Favari se depararam com Lourenço no cruzamento da avenida Nuno de Assis com a rua Araújo Leite. Ainda de acordo com o texto, a placa do veículo do mecânico estava dobrada e os faróis apagados. Ele não teria parado após a ordem dos PMs, desrespeitando sinalizações e dois bloqueios.

Em uma estrada de terra, os policiais teriam visto lampejos de luz vindos da direção onde Lourenço estava e, por esse motivo, dispararam nesta direção, acertando a vítima uma vez na cabeça. Ao perceberem que o mecânico tinha sido atingido, o levaram na viatura ao Pronto-Socorro Central, onde ele morreu.

O juiz avaliou que, apesar de ainda existirem dúvidas sobre a arma encontrada próxima ao local onde Lourenço foi alvejado, além do laudo residuográfico ter apontado que havia esfregaços e não micropontos de chumbo em sua mão direita, sendo que o mecânico que era canhoto, os outros elementos comprobatórios apontam para essa situação. Para o juiz, o mecânico poderia ter provocado o esfregaço em seu trabalho.

Também afirmou que “o fato de ter sido atingido por trás não significa que estava em fuga e não teria como efetuar os disparos”. Conforme laudos e fotos, o tiro teria atingido Lourenço na lateral esquerda da cabeça, posição que, de acordo com Okuno, pode ser possível “em uma troca de tiros, dependendo do movimento de cabeça da vítima”, consta em sua sentença.


Acusação vai recorrer

Informado pela reportagem de que o juiz Benedito Okuno, da 1.ª Vara Criminal de Bauru, entendeu que os então policiais militares Lincoln César Cares, Renato Valderramas De Favari e Ricardo Antônio do Amaral não sejam julgados por júri popular porque não agiram com a intenção de matar o mecânico Jorge Luiz Lourenço, em abril de 2007, o advogado da família do mecânico adiantou que vai recorrer. Em nota, o escritório Sérgio Ribeiro Sociedade de Advogados, que defende a família, diz que no processo há, sim, provas de que os policiais tinham a intenção de matar.

“No entendimento da família, esta sentença, que acaba inocentando os ex-policiais, vai contra as provas que estão nos autos. As provas periciais são incontestáveis. Para a família, foi homicídio doloso (com a intenção de matar) e houve fraude processual. A família vai apelar ao Tribunal para que a decisão seja reformada e que os ex-policiais, que já foram expulsos da Polícia Militar, sejam julgados pelo Tribunal do Júri”, diz a nota.


Defesa espera absolvição

Após a sentença do juiz Benedito Okuno, da 1.ª Vara Criminal de Bauru, que os então policiais militares Lincoln César Cares, Renato Valderramas De Favari e Ricardo Antônio do Amaral não sejam julgados pelo Tribunal do Júri porque não agiram com a intenção de matar o mecânico Jorge Luiz Lourenço em abril de 2007, a advogada dos réus espera que o caso retorne à Justiça Militar e que os quatro sejam absolvidos.

Informada sobre a decisão pela reportagem, a advogada Fernanda Cabello da Silva Magalhães afirma que no processo não havia provas que os acusados agiram com a intenção de matar.

Apesar de o juiz ainda não ter escrito na sentença que o caso retorne à Justiça Militar, caso a decisão não seja reformada há chance de os réus serem julgados pelo Tribunal de Justiça Militar por homicídio culposo (sem a intenção de matar). E é aí que a defesa dos então policiais espera que a conclusão seja de que agiram no estrito dever da profissão e em legítima defesa.

Se esta for a decisão, os acusados poderão, inclusive, reivindicar a reincorporação à Polícia Militar. Na defesa, a advogada argumenta que os réus agiram no estrito cumprimento do dever legal e em legítima defesa. Ressaltando que o terreno onde o mecânico entrou na fuga e foi morto, um matagal no Mary Dota, é em declive, a defesa afirma que ele poderia ver os policiais e os policiais não poderiam vê-lo.

Sobre a acusação de fraude processual, pois o mecânico apresentava resquícios de chumbo na mão direita, quando era canhoto, e não na esquerda, a defesa argumenta que o exame residuográfico é de orientação, não de certeza.

A defesa dos acusados aponta, ainda, que todos, em depoimentos separados, apresentaram versões semelhantes para o caso.

segunda-feira, 31 de maio de 2010

Jornal da Cidade - 28/05/2010 - Geral

Debate do toque de recolher destaca a falta de políticas para adolescentes


por Luciana La Fortezza

A audiência pública realizada ontem para discutir a proposta da Polícia Militar de implementar em Bauru o toque de recolher expôs, novamente, a falta de políticas públicas voltadas a crianças e adolescentes. O evento, que lotou o auditório da Subseção local da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), contou com a presença maciça de representantes de entidades contrárias à medida, que prevê limite de horário para pessoas com idade inferior a 18 anos permanecerem na rua à noite.

O idealizador da proposta, o comandante do 4º Batalhão da Polícia Militar do Interior (4º BPM-I), tenente-coronel Nelson Garcia Filho, foi o primeiro a abordar a questão após a formação da mesa. Em sua fala, ressaltou que o toque de recolher visa não somente deter a criminalidade juvenil, mas principalmente proteger os jovens de perigos como o crack. A preocupação foi considerada pela psicóloga e professora universitária Juliana Pasqualini como estratégia de convencimento para a aplicação da medida.

Para ela, o intuito real da iniciativa é proteger a sociedade dos próprios adolescentes, que tornam-se vulneráveis à medida que não dispõem de qualquer perspectiva de futuro. Para a maioria dos presentes na audiência, o toque de recolher representa um apartheid social. Passa a falsa ilusão de que se faz alguma coisa para proteger crianças e adolescentes, sendo que nenhuma política pública capaz de alterar as condições de vida a que eles estão submetidos é implementada.

Já para os defensores da proposta, é fácil fazer discursos longe das ruas e analisar tragédias familiares no conforto de casa, como se fossem filme. “E não temos nem o direito de tentar?”, questiona Garcia. Na opinião dele, não trata-se de cárcere privado porque os jovens terão horário, mesmo que limitado, para usufruir da noite. Poderão permanecer nas ruas até meia-noite (aos sábados, domingos e feriados). De segunda a sexta, até as 23h. Em alguns municípios, o limite não chega às 23h.


Autoritarismo

No entanto, para o advogado Ariel de Castro Alves, representante do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), trata-se de um estado de sítio. Na opinião dele, além de ser um retrocesso do ponto de vista histórico, o toque de recolher pode ser entendido como um atestado de que nada foi feito em benefício às crianças e adolescentes. Para Alves, não passa de uma medida demagógica, oportunista, além de autoritária, que visa tirar crianças pobres das ruas. Ele questionou se o toque terá a mesma eficácia em condomínios fechados, por exemplo.

Garcia, no entanto, ressaltou que, atualmente, o tráfico de drogas alicia jovens de todas as raças e classes sociais. Lembrou um trecho de matéria publicada pelo JC há um ano, quando o toque começou a ser implementado em algumas cidades paulistas. Na ocasião, o professor de história da Universidade Estadual Paulista (Unesp) Célio Losnak foi entrevistado. “É fácil dizer ‘vamos reprimir’. Como é fácil dizer ‘não vamos reprimir’. Não estamos mobilizados para pensar o problema”, disse na oportunidade.

Mas o fato do assunto promover uma discussão entre cerca de 200 pessoas, ontem, foi elogiado por todos os presentes que se manifestaram. Foi unânime, assim como a constatação da ausência de políticas públicas suficientes para atender todas as crianças e adolescentes de Bauru.

Jovem ex-dependente de drogas deu testemunho a convite da PM

A convite do tenente-coronel Nelson Garcia Filho, Cristiano de Souza Almeida, 22 anos, prestou seu depoimento durante a audiência de ontem. Contou que aos 10 anos foi levado pelo grupo de amigos a usar droga. Era justamente madrugada quando decidiu ceder e experimentar - após resistir algumas vezes às ofertas. A partir de então, sua vida tornou-se um inferno, garantiu. Com o apoio da mãe e do patrão, Fernando Mantovani, conclui há seis meses seu tratamento no Esquadrão da Vida. Colocou-se como favorável ao toque de recolher.

Deu o testemunho na presença do patrão, que também é vereador. Além dele, o único representante da Câmara Municipal anunciado no evento foi Natalino da Pousada. Nenhum outro parlamentar compareceu. O prefeito de Bauru, Rodrigo Agostinho, também não esteve presente. Foi representado pela titular da Secretaria Municipal do Bem-Estar Social (Sebes), Darlene Têndolo, que se manifestou contra a medida.

Ao colocar-se como funcionária pública e assistente social, lembrou que a liberdade hoje usufruída foi conquistada com o sangue de muitos jovens que lutaram contra a ditadura e com as lágrimas de muitos pais que perderam seus filhos. Se comprometeu, com a ajuda de todos os presentes, a construir programas inovadores que atendam à juventude em Bauru.


Juiz decidirá após parecer do MP

O juiz da Vara da Infância e Juventude, Ubirajara Maintinguer, decidirá em aproximadamente um mês se Bauru implementará o toque de recolher. Nos próximos dez dias, interessados poderão enviar ao Ministério Público manifestações sobre o assunto. Também com base dos argumentos, o promotor Lucas Pimentel de Oliveira concluirá seu parecer e o encaminhará ao magistrado, que se manifestará sobre o tema.

O promotor demonstrou interesse especial nas falas de representantes de bairro. Uma delas, Maria Helena de Lima Menezes, do Conseg Leste-Norte, mostrou-se favorável ao toque de recolher. Disse que acompanha o desespero de mães que não sabem o que fazer com os filhos dependentes químicos.

Contou que sempre viveu com limites em casa e nem por isso enfrentou problemas com pais ou filhos. Na opinião dela, os discursos durante a audiência foram políticos. Já Osvaldir Martins, do Conseg Oeste-Noroeste, teme que o toque de recolher represente apenas mais uma forma de repressão contra pobres e afrodescendentes. Cobrou políticas públicas, mais escolas e menos presídios. Por representarem a comunidade, suas colocações foram consideradas legítimas pelo promotor.

O debate foi aprovado tanto pelo membro do MP quanto pelo juiz, que classificou a audiência como tranquila. Havia rumores de que uma manifestação de repúdio ao toque de recolher seria realizada.

“O jovem julga de forma severa porque julga com o que aprendeu. Já a pessoa com mais idade julga com complacência porque julga pelo que viu”, comentou Maintinguer. De acordo com ele, todos os presentes serão um pouco responsáveis pela decisão que será conhecida em breve.


Problema antigo

A ausência de políticas públicas para crianças e adolescentes é um problema antigo. Pelo menos desde 2002 se discute o mesmo assunto em Bauru sem que nada tenha sido feito. A advertência partiu de Primo Mangialardo, que representou o Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp) e o Conselho Comunitário de Segurança (Conseg) Centro-Sul, no evento de ontem. Por essa razão, ele se disse favorável ao toque de recolher.

Reiterou que crianças e adolescentes não entrarão em camburão, não serão recolhidos pela polícia, nem estarão sujeitos a grades, como nos anos de chumbo. Ainda assim, a repressão e o período de ditadura foram lembrados nos discursos da maioria dos que usaram a palavra.

O representante do Conanda Ariel de Castro Alves, inclusive, ressaltou o quanto os jovens lutaram pela redemocratização do País e como participaram de movimentos como o que resultou no impeachment do então presidente Fernando Collor de Mello. Ressaltou o quanto natural e importante é a rebeldia nessa fase da vida.

Entre uma fala e outra, teve quem admitiu o desejo da sociedade na construção da paz e segurança. No entanto, nesta busca, imputa-se à família uma responsabilidade que também é do Estado. Pai e mãe são obrigados a resolver em casa as consequências de problemas decorrentes da falta de acesso a saúde, educação e lazer. Se não conseguem controlar os filhos que vivem qualquer perspectiva de vida, a culpa é deles, não da omissão do Estado. Participantes também defenderam o trabalho com as famílias, muitas vezes desestruturadas. Numa situação de carência emocional e material, os adolescentes ficam mais vulneráveis ao crime.

Eles nunca são lembrados quando aguardam numa fila por educação e saúde, mas sim quando estão com uma arma na mão, frisou Ariel de Castro Alves. Justamente para evitar tal assédio é que os defensores do toque de recolher lutam pela medida, considerada protetiva. Nesse sentido, a batizaram como toque de acolher. Se implementado, uma portaria poderia abrir exceções de horários em eventos especiais como a Copa do Mundo.

“Não é repressão, não é separar o rico do pobre”, garante Primo. Ainda assim, o próprio Conselho Tutelar entende a situação como vexatória e discriminatória para crianças e adolescentes.




70% dos crimes ocorrem entre 8h e 22h, afirma advogado do Conanda


Não só no Brasil, como no mundo, 70% dos crimes são registrados das 8h às 22h, segundo o representante do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), advogado Ariel de Castro Alves. Não por acaso, o toque de recolher em municípios onde foi implementado não resultou em queda nos índices de criminalidade.

Para ele, os limites devem ser estabelecidos pelos pais, sujeitos a sanções previstas no Código Penal e no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). “O Estado não pode intervir de forma abusiva na vida das pessoas. Basta aplicar a lei, não são necessárias medidas de histeria”, disse Alves. De acordo com o representante do Conanda, o jovem só aprenderá a viver em liberdade se usufruir dela.

Ele defendeu programas com educadores sociais, o fortalecimento de entidades que trabalham na área e combate ao crime. Além disso, na luta contra o tráfico, diversos presentes ressaltaram a fragilidade dos serviços oferecidos, que não dispõem, por exemplo, de atendimento 24 horas a usuários e seus familiares. A Campanha Nacional de Combate ao Crack, lançada pelo governo federal, também foi lembrada.

“Essas medidas estão claras e deverão ser implantadas em todos os municípios. Uma delas é aumentar o número de leitos nos hospitais, ampliação dos CAPs que devem atender 24 horas, construção de abrigos para permanecerem no máximo 40 dias, consultórios de rua, que não existem em Bauru. Não existem também as casas de passagem para moradia transitória ao usuários. Outra coisa que falta é o centro de convivência para usuários”, comentou a psicóloga Maria Orlene Daré.

Sem acesso à saúde, educação e cultura, muitos jovens têm tomado a zona sul de Bauru, onde as opções de lazer estão concentradas. Esse avanço da periferia em áreas de classes mais abastadas foi apontado por vários presentes como responsável pelo interesse no toque de recolher que, inclusive, teria como objetivo.
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Toque de Recolher aguarda audiência e já está no Orkut

por Verônica Lima

Grupo Contra Violência e Violação de Direitos Humanos busca ampliar debate sobre a medida em Bauru

No próximo dia 27, quinta-feira, a cidade de Bauru discutirá o Toque de Recolher para menores de 18 anos em audiência pública. Pela primeira vez, a medida está em pauta em uma cidade com mais de 100 mil habitantes, e mobiliza tanto órgãos oficiais da sociedade, como a polícia, quanto instâncias informais, como a rede social Orkut, onde foi inaugurada neste mês uma comunidade contra a restrição.

A intenção segue a tendência de outras cidades do estado de São Paulo, como Ilha Solteira, justificando a necessidade de adotar a medida como uma forma de “proteção” aos adolescentes da cidade. O Grupo contra Violência e Violação de Direitos Humanos de Bauru (GVVDH) defende e promove uma discussão aprofundada ao Toque de Recolher. Sob o argumento da proteção, a ação esconde diversos problemas sociais para os quais a retirada dos adolescentes das ruas não é solução eficaz.

Argumentos judiciais mostram que o Toque de Recolher fere a Constituição Federal e outros dispositivos de garantia de Direitos, como o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Instituições de todo o país em defesa da criança e do adolescente, como os Conselhos Estadual e Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONDECA e CONANDA), Associação de Conselheiros Tutelares do Estado de São Paulo (ACTESP), Fórum Nacional dos Conselhos Tutelares (FCNCT) já se posicionaram contra o Toque de Recolher. Segundo as entidades, a medida não soluciona o verdadeiro problema da falta de políticas públicas para essa faixa etária nas cidades brasileiras.


Fracasso

Na cidade de Ilha Solteira, uma das primeiras a adotar o Toque de Recolher no estado, a implementação da medida não se concretizou. Segundo Elias Lopes Vieira, presidente do CMDCA (Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente), além da ineficácia da determinação no combate à diminuição dos índices de criminalidade, não houve condições para controlar e fiscalizar a medida. “O real problema não é tratado e nem mesmo discutido nessa perspectiva”, destaca Vieira.

Segundo o presidente do CMDCA, o Conselho Tutelar de Ilha Solteira se recusou a ajudar na implantação do Toque de Recolher, amparados pela justificativa de que o órgão deve proteger e não punir os jovens, de acordo com o ECA. Além disso, as diversas situações repressivas e vexatórias pelas quais os jovens da cidade passaram apenas contribuíram para uma resposta contrária à medida hoje já considerada fracassada na cidade.


Rede social

A discussão promovida pelo GVVDH de Bauru também está no site de relacionamentos Orkut. A comunidade intitulada “Toque de Recolher - TÔ FORA” foi inaugurada no último dia 08 de maio com objetivo suscitar a o debate também entre os adolescentes, principais afetados pela medida. O espaço na rede social já conta com mais de 300 membros e tem servido como local para expressão de opiniões dos jovens. Em um dos fóruns de discussão da comunidade, uma adolescente faz alguns questionamentos sobre a medida. “Gente de bem fica trancado em casa, enquanto os bandidos fazem o que bem querem? O que eles acham que vão conseguir com isso?”, indaga a adolescente.

A audiência foi convocada pelo juizado e promotoria da Infância e da Juventude, juntamente OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e a Defensoria Pública Estadual. A requisição do debate foi feita pelo comando do 4º Batalhão da Polícia Militar.

Sobre o GVVDH
O Grupo contra a Violência e Violação de Direitos Humanos de Bauru foi formado em dezembro de 2007, após o bárbaro episódio de tortura e morte do adolescente Carlos Rodrigues Júnior, de 15 anos.
Fazem parte do grupo diversas entidades e cidadãos da sociedade civil unidos no propósito de combater a violência e violação de Direitos Humanos em Bauru e região. Entre as entidades destacam-se: CRP (Conselho Regional de Psicologia), CRESS (Conselho Regional de Serviço Social – Subseção Bauru), Instituto Acesso Popular, Núcleo pela Tolerância da Unesp, Conselho Municipal da Condição Feminina. São colaboradores nesta discussão: Conselho Tutelar, Apeoesp, PSOL e Comissão dos Direitos Humanos da OAB

Saiba mais:
Comunidade Orkut: http://www.orkut.com.br/Main#Community?cmm=101602909

Matéria sobre extinção do Toque de Recolher em Ilha Solteira: http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20100420/not_imp540547,0.php

Video feito por jovens sobre Toque de Recolher: http://www.youtube.com/watch?v=fz0IPMasp80

Informações à imprensa
Verônica Lima – assessora de imprensa do GVVDH
Telefones: (14) 9107 6442/ 3019 0155
Emails: veronica.alveslima@gmail.com / gvvdhbauru@gmail.com


Conheça o documento produzido pelo GVVDH em repúdio à iniciativa de implantação do Toque de Recolher em Bauru:


TOQUE DE RECOLHER: A INSTITUCIONALIZAÇÃO DO APARTHEID SOCIAL!!!

Setores da cidade iniciaram a discussão do toque de recolher no município de Bauru. Tal medida visa recolher menores de 18 anos em suas residências em horários determinados.
O início desta discussão se dá pela falsa cortina da alegação de proteção as crianças e adolescentes, que estariam sujeitos a possíveis situações de riscos, devido ao fato de estarem freqüentando espaços públicos em determinados horários, julgados por alguns como horários inadequados.


O Grupo Contra a Violência e Violação dos Direitos Humanos, composto por diversas entidades da sociedade civil, preocupado com as possíveis conseqüências desta medida, apresenta POSICIONAMENTO CONTRÁRIO ao toque de recolher.

A proteção da criança e do adolescente é uma conquista da sociedade civil na defesa das liberdades democráticas e nas garantias dos Direitos Humanos. Tais garantias foram chanceladas com a atual redação do artigo 227 da Constituição Federal, o qual institui, além de outros pontos, as crianças e adolescentes como sujeitos de Direitos dentro de nosso Estado.

Importa reforçar que o direito à liberdade é clausula pétrea da nossa CF/88, tido como direito fundamental da pessoa humana, previsto no artigo 5°, que trata da inviolabilidade do direito à liberdade. É certo que a Constituição Federal de 1988 ao proteger o direito à liberdade a todos os brasileiros e estrangeiros residentes no País, inclui as crianças e adolescentes.

Este reconhecimento das crianças e adolescentes como sujeitos de Direitos e de sua condição peculiar de pessoas em desenvolvimento fez com que se iniciasse a construção de uma contraposição ao até então vigente Código de Menores de 1979, que tratava da doutrina da situação irregular.

Com o advento do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), no ano de 1990, aprofunda-se a construção da doutrina da proteção integral, a qual estabelece a prioridade absoluta da criança e do adolescente a parir da responsabilidade da família, da sociedade e do Estado, na defesa e garantia desta proteção.

A partir de então, temos o início de um novo momento nas relações com as crianças e adolescentes, na busca de superar as previsões autoritárias e invasivas próprias do Código de Menores, incluindo a família e a sociedade como agentes ativos de primeira proteção das crianças e adolescentes juntamente com o Estado, ambos concorrentes em assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação de direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.

Dessa forma, a cidade de Bauru coloca-se na contramão da História ao aventar a implantação do toque de recolher. A possibilidade de implementação da medida representa um retrocesso frente a todos os avanços conquistados, com a promulgação da nossa Constituição Federal e a aprovação do ECA, instrumentos importantíssimos de garantias e direitos dos cidadãos e das crianças e adolescentes.

O toque de recolher, portanto, fere frontalmente a Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente, bem como as normas de direito internacional das quais o Brasil é signatário. Soma-se a isto a ineficácia de tal instituto do ponto de vista do combate e prevenção à criminalidade e reforça-se o perigo que tal medida representa para às liberdades e garantias fundamentais.

A livre circulação e ocupação dos espaços públicos é direito de todos(as) os(as) cidadãos(ãs), inclusive das crianças e adolescentes, os quais têm este direito garantido no ECA em seu artigo 16, que determina o direito de ir e vir e estar nos logradouros públicos e espaços comunitários.

O toque de recolher impedirá que meninos e meninas estejam em espaços públicos destinados à convivência e livre circulação, criando, sem qualquer amparo constitucional ou justificativa social consistentes, limites à liberdade desses adolescentes, mostrando-se, dessa forma, contrário ao ECA, o qual adota a doutrina de proteção integral nos direitos humanos.

Tal fato não está amparado pelo nosso ordenamento jurídico e representa um recurso de inspiração autoritária que faz lembrar as velhas manifestações discriminatórias do “crime de vadiagem”, que por anos serviu para perseguir os homens e mulheres marginalizados(as) no nosso País. Recurso este, que retoma parte da lógica da doutrina de situação irregular que, pelo Código de Menores de 1979, oferecia, em vez da proteção social para nossas crianças e adolescentes, a perpetuação da crimininalização da infância e da juventude brasileira.

Nota-se claramente que o toque de recolher fere o principio da proteção integral dos adolescentes, que são sujeitos de direitos com absoluta primazia no atendimento do Estado, da família e da Sociedade, sendo, portanto, uma afronta à ordem social e legal vigente no país.
O malfadado toque de recolher não resolve o problema de nossas crianças e adolescentes posto ser uma medida repressiva, que não aponta saída para os problemas de falta de políticas públicas do município como reais alternativas de inclusão desses jovens na sociedade.


A falta de políticas públicas para toda a juventude é o cerne do problema e não a permanência dos jovens nos espaços públicos, espaços os quais devem ser ocupados por toda a sociedade inclusive pelas crianças e adolescentes.

Tal medida reforçará o apartheid social que já vivemos na cidade, separando-a em dois pólos: o da “zona sul”, habitada e freqüentada por jovens com acesso a shopping, cinema, lanchonetes, etc.; e o das zonas periféricas, habitada por uma juventude que possui raras alternativas de cultura, lazer, esporte, entre outras, e que terá ainda mais restringido seu acesso aos equipamentos de lazer e entretenimento da cidade.

O toque de recolher está sendo apresentado como “defensor” da criança e do adolescente. Contudo, uma das justificativas fundamentais apresentadas por seus defensores baseia-se nos índices de envolvimento de adolescentes com atos infracionais. Vemos, assim, que o discurso a favor do toque de recolher está imbuído de uma perversa mistura entre “situação de risco” com “ato infracional”. Preconceituosamente, o toque de recolher busca tirar das ruas as crianças e adolescentes que supostamente “oferecem risco à sociedade”, numa clara justificativa de proteção da sociedade, em detrimento da proteção integral da criança e do adolescente. Este ato constitui muito mais em um mecanismo de “limpeza social” do que efetivamente com o objetivo de resguardar e defender a proteção integral das crianças, adolescentes e da juventude.

O toque de recolher implicará ainda em outro problema social muito grave. As relações familiares serão relativizadas de maneira genérica, pois o Estado passará a intervir no poder familiar e com isso as relações familiares ficarão prejudicadas.

Ainda no que tange à família, cabe reforçar que o Estado não pode, pelo simples trânsito de adolescentes e jovens fora de uma faixa de horário, prever relativizações do poder familiar numa presunção descabida de que a permanência em locais públicos desacompanhadas dos pais, pó si só, ensejaria de maneira tão drástica uma intervenção do Estado, como por exemplo, a limitação do horário para a circulação.

Tal medida, toque de recolher, busca esconder um grave problema social e em conjunto executar o desejo social de setores conservadores da sociedade de se verem “livres” da presença incômoda de meninos e meninas pobres da periferia que, na rua, sem assistência social e sem apoio para o seu desenvolvimento, denunciam com sua própria miséria os perversos e insuportáveis índices de injustiça e desigualdade social.

Nota-se, portanto, que o toque de recolher resulta em um atentado ao direito de convivência comunitária, restringindo a possibilidade de interação das crianças e adolescentes com os seus colegas da mesma idade e assim dissemina, ainda, um sentimento de terror nos espaços públicos, provocado pelo discurso repressivo que se criará com a implementação da medida.

Reforçamos ainda o risco da implementação do toque de recolher como medida que resultará em mais violência contra os jovens, que já são vitimas do racismo e todas as outras formas de discriminação, e que serão expostos ao discurso da situação de risco, através das lamentáveis políticas de recolhimento.

Em lugar de medidas repressivas, devemos investir em medidas pedagógicas de educação da juventude. O toque de recolher em nada contribui para o desenvolvimento humano e da personalidade de nossas crianças e adolescentes e compromete o desenvolvimento de sua autonomia, na medida em que impõe um modelo de autoridade baseada no medo, com base no cerceamento da liberdade.

Por tudo isso, o Grupo Contra a Violência e Violação dos Direitos Humanos é contra esta medida repressiva. O toque de recolher é discriminatório, ilegal, inconstitucional e retrógrado. Portanto, deve ser rejeitado pela população bauruense!

Bauru , 17 de maio de 2010.

Assinam:
Grupo contra a Violência e Violação de Direitos Humanos
Conselho Regional de Psicologia – Subsede Bauru
Comissão de Direitos Humanos, Cidadania e Legislação Participativa
da Câmara Municipal de Bauru
Conselho Regional de Serviço Social – Seccional Bauru
Observatório dos direitos humanos da UNESP de bauru
Instituto Acesso Popular de Educação Cultura e Política
Juventude do Partido dos Trabalhadores
Partido dos Trabalhadores
União Estadual dos Estudantes de São Paulo
Núcleo pela tolerância UNESP bauru
Partido socialismo e liberdade
Sindicato dos professores do ensino oficial do estado de São Paulo - APEOSP
Centro acadêmico Paulo freire
Estudantes da UNESP – jornalismo e psicologia
Conselho Tutelar de bauru
Partido Comunista do Brasil - PCdoB
União da Juventude Socialista - UJS
União Municipal dos Estudantes Secundaristas de Bauru – UMESB
Movimento dos Sem-Terra




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Carta pública: "Toque de recolher" é violação do direito de liberdade

O Conselho Regional de Serviço Social – Cress 9.ª Região – SP, na defesa intransigente dos direitos humanos e da liberdade como valor ético manifesta seu posicionamento sobre o “toque de recolher” imposto aos adolescentes. Sabemos dos desafios de proteger e educar crianças e adolescentes num contexto de violência provocado pela desigualdade social. Embora exista por parte da população o desejo de preservar os/as adolescentes, entendemos ser inadmissível que o “toque de recolher” seja uma alternativa para tanto pelos seguintes motivos:

- esta “determinação” não condiz com a legislação e beira o estado de exceção;

- o Conselho Tutelar, previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), o qual normatiza suas atribuições, tem o dever de zelar pelos direitos da criança e do adolescente, não sendo órgão de segurança pública nem tendo funções neste campo;

- o ECA traz um novo paradigma na relação com a população infanto-juvenil, tendo como princípio a democracia e que retira a concentração de poderes que no extinto Código de Menores era atribuído ao juiz;

- aos órgãos do Judiciário, Conselho Tutelar, segurança pública e Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA) cabe promover os direitos de forma inter-institucional, buscando nas suas competências legais o seu campo de atuação;

- impor medidas cerceadoras não condiz com o avanço democrático e resgata falsas saídas. Os direitos devem ser realizados pelas políticas públicas, que devem atender as demandas sociais nos diversos campos, seguindo o direito constitucional de participação efetiva da população;

- ao CMDCA cumpre elaborar e deliberar quanto às políticas públicas para a criança e o adolescente em seu município, priorizando a convivência familiar e comunitária. Tal processo deve envolver a comunidade, numa relação pedagógica e que altere a cultura autoritária e do medo, na defesa de uma relação de respeito e vínculos saudáveis;

- a convivência comunitária é um dos princípios de protocolos internacionais dos quais este País é signatário e que o Brasil adotou em sua legislação interna. A convivência comunitária exige mudanças nas relações para o seu pleno desenvolvimento;

- há um grande risco de retirar a referência de cuidado e autoridade da família, podendo afastar ainda mais as gerações na construção de sua convivência e laços.

Impor poder e força àqueles de quem devemos cuidar, para o desenvolvimento de sua autonomia e emancipação, revela a falência dos adultos na sua relação com os mesmos. Enfim, a sociedade deve se unir para obter soluções para os conflitos e dificuldades, buscando uma construção que nos humanize e fortaleça o respeito às diferenças, combata toda expressão de violência e reconheça a criança e o adolescente como valor para a humanidade.



Carta aprovada no Fórum de Dirigentes do Cress 9.ª Região-SP
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terça-feira, 18 de maio de 2010

Toque de recolher em Bauru

No próximo dia 27 de maio de 2010 ocorrerá no Auditório da OAB, das 9:00h às 17:30h, a Audiência Pública sobre o Toque de Recolher para crianças e adolescentes em Bauru.

A participação é aberta a toda a população.

O GVVDH é contrário à implementação dessa medida repressiva, discriminatória e inconstitucional em nossa cidade. Junte-se a nós nessa luta!

Clique aqui para conhecer o parecer do CONANDA (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente) contrário ao Toque de Recolher.


Leia abaixo artigo publicado na Coluna Opinião do JC discutindo o Toque de Recolher:


24/04/2010 - Opinião 1

Toque de recolher para adolescentes: solução para a sociedade bauruense?

Está em tramitação na cidade de Bauru o processo para implantar o toque de recolher para menores de 18 anos. Trata-se da proibição da presença de adolescentes nas vias públicas e estabelecimentos comerciais depois das 23h de segunda a sexta-feira e após a meia-noite aos sábados, domingos e feriados. A iniciativa configura uma tentativa de enfrentamento da incidência cada vez maior de adolescentes envolvidos com drogas, furtos e roubos na cidade. A medida teria, em tese, um caráter preventivo, objetivando afastar os adolescentes das drogas e dos crimes.

Entidades e órgãos ligados à área da infância e adolescência serão chamados a se manifestar a respeito em audiência pública a ser realizada no mês de maio, expressando sua avaliação sobre a pertinência e eficácia da medida: o toque de recolher é uma medida válida para o enfrentamento dos problemas relacionados à juventude de nossa cidade? Trata-se de uma medida potencialmente eficaz para a solução desses problemas? Responder a essas questões implica analisar e compreender a natureza do problema e suas causas. Para além do já mencionado crescente envolvimento dos adolescentes com o álcool e outras drogas e atos infracionais, é de conhecimento geral o “incômodo” que representa para as camadas médias e altas da sociedade bauruense a ocupação do shopping center às sextas-feiras à noite pelos adolescentes da periferia. A avenida Nações Unidas na altura das quadras 29 e 30 tem se tornado outro “ponto de encontro” da juventude pobre da cidade que ousa romper com o apartheid social silenciosamente instituído.

Todos esses fenômenos expressam as profundas contradições de nossa sociedade. Evidenciam a imensa desigualdade de acesso à cultura, ao esporte e ao lazer. A dureza das condições de vida imposta à maioria dos jovens em contraste com a realidade da adolescência das camadas médias e altas. A falta de perspectivas de futuro que assola a juventude pobre. Em última instância, a gritante ausência de políticas públicas para a juventude brasileira. Assim, sem adentrar a discussão sobre a ilegalidade e inconstitucionalidade do toque de recolher ou sobre o direito de ocupação do espaço público, queremos aqui propor uma reflexão sobre causas e efeitos. Impedir os adolescentes de circular em espaços públicos em determinados horários em nada altera a angústia e a falta de sentido e de perspectivas que se expressam sob a forma de comportamentos “delinqüentes”. Diante disso, o parecer do Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente), que se posiciona contrariamente ao toque de recolher, o qualifica como “uma medida paliativa e ilusória, que objetiva esconder os problemas no lugar de resolvê-los”. Isso porque enfrentar de fato os problemas implica agir sob re as causas, e não sobre os efeitos.

A psicologia nos ensina a pensar sobre a adolescência como um período em que se assimilam modelos e valores e se formam os modos de pensar sobre a vida, sobre as relações entre as pessoas e sobre o próprio futuro. Um período, portanto, em que se estrutura o sentido pessoal da vida e se delineiam aspirações para a vida futura, as quais se convertem em motivos e finalidades que orientam as ações do adolescente. O fato é que o conteúdo concreto dessas aspirações depende fundamentalmente das condições sociais em que vive e se educa a juventude. Não se trata, portanto, de recolher os adolescentes. Trata-se, outrossim, de repensar coletivamente as formas de educação da juventude e as condições oferecidas para a construção de projetos de futuro e de sentido para a vida.

A autora, Juliana Pasqualini, é psicóloga e doutora em Educação Escolar, membro da Comissão de Criança e Adolescente do Conselho Regional de Psicologia - Subsede Bauru e do Grupo contra a Violência e Violação de Direitos Humanos.
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segunda-feira, 13 de abril de 2009

Ato pelos 2 anos da morte de Jorginho

O GVVDH realizou no último sábado, 04 de abril de 2009, ato público para marcar os dois anos do assassinato de Jorge Luiz Lourenço, o Jorginho. Confira a reportagem do Jornal da Cidade noticiando a realização do ato e em seguida algumas fotos do protesto:


Ato público lembra morte de Jorginho, vítima da violência em Bauru

Pomba da Praça da Paz estará em luto em sinal de protesto no evento organizado por familiares e organizações de direitos humanos

O Movimento contra Violência e Violação de Direitos Humanos realiza no próximo sábado, 04 de abril, ato público para lembrar os dois anos da morte de Jorge Luiz Lourenço, o Jorginho, em uma ação da polícia.

Com o tema Pomba da Paz em luto – ato público contra violência pelos dois anos da morte de Jorginho, a atividade na Praça da Paz, região central de Bauru, começa a partir das 20h, com a presença de familiares, amigos e de organizações que atuam na promoção de direitos humanos na cidade.

Entre as organizações que colaboram para a realização do ato estão o Conselho Regional de Psicologia (subsede Bauru), Conselho Regional de Serviço Social, Observatório de Educação em Direitos Humanos e Núcleo pela Tolerância da Unesp, Conselho Municipal da Condição Feminina e Instituto de Acesso Popular. Estarão presentes também, os representantes: Observatório das Violências Policiais de São Paulo, Entidade AMPARAR-SP, Mães e Militantes do Tribunal Popular de São Paulo e, Militante do Movimento de Direitos Humanos de Guarulhos.

A proposta é mais uma vez chamar a atenção da sociedade local para a violência cometida contra os jovens no Brasil e cobrar a responsabilização e justiça contra violações de direitos humanos.

O ato terá várias ações e momentos simbólicos, em sinal de luto pela morte de Jorginho. O caso chamou a atenção da população e entrou para o histórico das ações violentas da polícia na cidade. Em dezembro de 2007, o adolescente Carlos Rodrigues Júnior, 15 anos, foi torturado e morto por policiais militares dentro da própria casa.

A história de Carlos Rodrigues Junior, divulgada no Brasil e no mundo, estimulou a organização da sociedade civil de Bauru para atuar no enfrentamento a violência e violação de direitos humanos, abrindo caminho para a divulgação e denuncia de histórias parecidas de violência cometida contra jovens.

O caso Jorginho
O mecânico Jorge Luiz Lourenço, 22 anos, foi morto no dia 5 de abril de 2007, depois de evadir-se de uma ação rotineira de fiscalização da polícia, ao voltar do trabalho. Na perseguição policial, foi baleado na cabeça, em um matagal, no Núcleo Habitacional Mary Dota.
Os três policiais militares envolvidos na ação foram demitidos da corporação e ainda respondem processo na Justiça. A família espera agora o julgamento e condenação dos acusados.


Confira algumas fotos do ato:




sexta-feira, 3 de abril de 2009

2 anos da morte de Jorginho

Ato público lembra morte de Jorginho, vítima da violência em Bauru
Pomba da Praça da Paz estará em luto em sinal de protesto no evento organizado por familiares e organizações de direitos humanos

O Movimento contra Violência e Violação de Direitos Humanos realiza no próximo sábado, 04 de abril, ato público para lembrar os dois anos da morte de Jorge Luiz Lourenço, o Jorginho, em uma ação da polícia.

Com o tema Pomba da Paz em luto – ato público contra violência pelos dois anos da morte de Jorginho, a atividade na Praça da Paz, região central de Bauru, começa a partir das 20h, com a presença de familiares, amigos e de organizações que atuam na promoção de direitos humanos na cidade.

Entre as organizações que colaboram para a realização do ato estão o Conselho Regional de Psicologia (subsede Bauru), Conselho Regional de Serviço Social, Observatório de Educação em Direitos Humanos e Núcleo pela Tolerância da Unesp, Conselho Municipal da Condição Feminina e Instituto de Acesso Popular. Estarão presentes também, os representantes: Observatório das Violências Policiais de São Paulo, Entidade AMPARAR-SP, Mães e Militantes do Tribunal Popular de São Paulo e, Militante do Movimento de Direitos Humanos de Guarulhos.

A proposta é mais uma vez chamar a atenção da sociedade local para a violência cometida contra os jovens no Brasil e cobrar a responsabilização e justiça contra violações de direitos humanos.

O ato terá várias ações e momentos simbólicos, em sinal de luto pela morte de Jorginho. O caso chamou a atenção da população e entrou para o histórico das ações violentas da polícia na cidade. Em dezembro de 2007, o adolescente Carlos Rodrigues Júnior, 15 anos, foi torturado e morto por policiais militares dentro da própria casa.

A história de Carlos Rodrigues Junior, divulgada no Brasil e no mundo, estimulou a organização da sociedade civil de Bauru para atuar no enfrentamento a violência e violação de direitos humanos, abrindo caminho para a divulgação e denuncia de histórias parecidas de violência cometida contra jovens.

O caso Jorginho
O mecânico Jorge Luiz Lourenço, 22 anos, foi morto no dia 5 de abril de 2007, depois de evadir-se de uma ação rotineira de fiscalização da polícia, ao voltar do trabalho. Na perseguição policial, foi baleado na cabeça, em um matagal, no Núcleo Habitacional Mary Dota.
Os três policiais militares envolvidos na ação foram demitidos da corporação e ainda respondem processo na Justiça. A família espera agora o julgamento e condenação dos acusados.

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quarta-feira, 4 de março de 2009

Garoto de BAURU - SP.
Silvia Beatriz Adoue

Ele não nasceu numa manjedoura, também não chegou aos 33 anos e nem surpreendeu os doutores do templo com a sua sabedoria. Há, porém, um par de coincidências entre os dois garotos. Para começo de conversa, os dois vieram ao mundo numa família pobre. Nenhuma boa estrela anunciou a chegada de Carlos, mas a mãe o recebeu, nove anos após o nascimento da sua filha, como se fosse trazido por um anjo. Foi um garoto comum entre todos os garotos comuns de Bauru (SP), com uma mãe e uma irmã, como todas as mães e irmãs que lutam cada dia para manter a casa em pé com a maior decência.

Mesmo que esteja num canto da sala, a máquina de costura é o coração da casa. Nela se revezam mãe e filha para pagar as contas. Aquela máquina, elas pensam, é uma bênção. Sem ela, não teriam segurado as pontas. O menino cresceu ouvindo aquele barulho intermitente como um acalanto. RRRRRRRR (silêncio) RRRRRRRR (silêncio). Não há feriado. Só param o barulho para não atrapalhar o sono dos vizinhos. Do seu quarto, era só ouvir o barulho e o Carlinhos podia adivinhar o gesto de cada uma das mulheres da casa. A irmã mais rápida, com intervalos menores. RRRR (...) RRRR (...). A mãe, mais cuidadosa, fazendo olhinho de japonês, já não enxergando. Ela sempre esquece de acender a luz. Trabalhando no escuro? Acende a luz, mãe. Nos últimos tempos, Carlos começou a ter raiva do barulho da máquina, raiva do esforço das mulheres que apenas lhes deixava tempo para comer, dormir e tomar banho. Serviço não se rejeita. A conversa, o filme, o cafuné e os planos de estudar junto, tudo que é bom ficava adiado. Ano próximo a gente volta, fazemos supletivo.

Tudo nessa casa ficava para depois. Eles tentaram, bem que tentaram. Foi bem difícil com Carlinhos. Ele não era bom pros estudos. Todo mês mudava a professora. E as que duravam mais também não tinham paciência com aquele bando de moleques. Carlinhos ia ficando para trás e a professora não reparava. A mãe também não sabia ajudá-lo com a lição. Ficou três anos na quarta série. Deu uma esticada boa de repente, os pelos crescendo nas pernas. Tinha vergonha de ficar entre as crianças menores e foi ficando cada vez mais caladão. Mais triste. Cada vez com mais raiva do barulho da máquina. Ia logo pro quarto ouvir música de fone de ouvido.
Quando era mais novinho, a máquina o fascinava. Ficava em pé observando a agulha subindo e descendo rapidão, mastigando o pano. Cuidado com a mão, Carlinhos, que você machuca. Ele ficava olhando hipnotizado. Mas, no último ano, o olho dele desviava da agulha, desviava da máquina, desviava dos olhos das mulheres da casa. Havia sangue no olho do menino. Não podia ouvir o barulho da máquina que saía pra rua. Pra onde você vai, menino? Vou co’s amigos. Esses amigos... Ele tem que fazer alguma coisa, mãe. Sem estudo, não vai conseguir emprego decente.
A mãe, Elenice, se matriculou com ele. Toda noite iam juntos pra aula e depois faziam juntos a lição de casa. Carlinhos recuperou a mãe da máquina. Era tão bom poder ser criança outra vez. Ele estava gostando, e aprendia. Mas tinha as contas pra pagar, aparecia serviço urgente. Carlinhos, vou ficar para terminar este serviço, você pega a matéria e a gente estuda junto depois. Faltou um dia e depois outro. Se a senhora não for, eu também não vou. A dona Elenice ficava agoniada, entre a espada e a parede. Como que era? Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come.


O bicho comeu. Carlinhos parou de ir pra escola. E saía direto pra rua. A dona Elenice tentava segurar. Ele até tem seu quarto. Mas co’barulho da máquina nem dá pra assistir televisão. Lembra. Ela lembra daquele dia que olhou pro seu menino. Aquele menino que nenhuma estrela anunciou, mas que ela recebeu como se fosse trazido por um anjo. Olhou bem no fundo do olho do menino de sangue no olho, pra além do sangue no olho, lá no fundo. Ano próximo a gente matricula de novo. Sim, mãe. Ano próximo a gente volta. E saiu pra rua.
Naquela sexta-feira, perto do Natal, Carlinhos apareceu com uma moto. De quem é essa moto? De um colega, mãe, vamos dar uma volta na avenida e depois ele pega.


Dona Elenice olha pra trás. Pensa como as coisas chegaram até esse ponto. Uma e outra vez pergunta a si mesma como podia ter evitado. Naquela madrugada, chegaram 6 policiais batendo com força na sua porta e gritando. É um erro, pensou. Mas não, estavam atrás do Carlinhos. Cinco ficaram trancados com ele e um ficou na sala com as mulheres. Horas a fio trancafiados. Devia ser um erro. Eles iam perceber. Meu filho é um menino. Eles vão perceber. Ele só tem 15 anos. É procedimento normal, senhora. No começo, ela até confiou. Mas ouviu, entre os gritos dos policiais, os gemidos do Carlos, mais menino que nunca no mesmo quarto onde ele se deitava para ouvir música. Na estante, ainda, os cadernos de escola. A porta se abriu e viu seu filho carregado, inconsciente, para fora da casa.

No quarto, os CDs fora das caixinhas, os cadernos no chão, o fio desencapado. Na sala, a máquina de costura, agora silenciosa, sem acalantos para o menino que não nasceu na manjedoura.

Silvia Beatriz Adoue é professora da Escola Nacional Florestan Fernandes (ENFF).

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

19/12/2008 - Jornal da Cidade

PM expulsa 5 dos 6 policiais do caso da morte no Mary Dota
Lígia Ligabue


Três dias após a morte do adolescente Carlos Rodrigues Júnior, 15 anos, completar um ano, o Comando Geral da Polícia Militar (PM) no Estado de São Paulo expulsou cinco dos seis policiais envolvidos no caso. A decisão, publicada na edição de ontem do Diário Oficial do Estado, determinou a exclusão do cabo Gérson Gonzaga e soldados Emerson Ferreira, Juliano Arcângelo Bonini, Ricardo Ottaviani e Maurício Delasta. O tenente Roger Marcel Vitiver Soares de Souza, que participou da ação que resultou na morte do garoto, também corre o risco de ser excluído dos quadros da PM.

Na madrugada do dia 15 de dezembro de 2007 os seis policiais militares foram à casa do adolescente, até então suspeito de ter participado de um assalto no Centro horas antes. Eles entraram na casa da família, onde estavam o adolescente, a mãe e uma irmã de Rodrigues Júnior. O adolescente ficou trancado no quarto na companhia de policiais. De acordo com o Instituto Médico Legal (IML), o rapaz levou 15 choques elétricos, sendo um fatal. Os seis policiais que trabalharam na ocorrência foram presos em flagrante. A motocicleta roubada foi encontrada no quintal do adolescente e a vítima do roubo reconheceu Rodrigues Júnior como autor do crime. Os cinco praças permaneceram presos no presídio Militar Romão Gomes, na Capital, até abril deste ano. Quando saíram, passaram a atuar apenas internamente na corporação. Ontem pela manhã, quando se apresentavam para o trabalho, foram comunicados verbalmente sobre a expulsão.

A publicação do Diário Oficial corrobora o parecer dado em novembro pelo Conselho de Disciplina, que avaliou a conduta do cabo e dos saldados durante a ação. O relatório final, que foi encaminhado ao Comando da PM, foi favorável à exclusão dos cinco policiais. A publicação no Diário Oficial cita que a pena foi aplicada diante do cometimento de atos contra às instituições, ao Estado e aos direitos humanos, além de serem desonrosos, incompatíveis com a função e consideradas transgressões disciplinares graves.

Ontem, os cinco policiais tiveram de entregar suas armas e deverão devolver suas carteiras funcionais em breve. Já a atitude do tenente Roger foi analisada por um Conselho de Justificação, que concluiu que ele não teria agido conforme o preconizado pela PM. No início de outubro, a Secretaria de Segurança Pública reduziu o salário do oficial a um terço e, apesar do tenente continuar fazendo parte dos quadros da PM, ele ficou temporariamente inativo e impossibilitado de vestir farda. Ainda não há decisão final sobre o seu caso.

Além do processo administrativo, os seis policiais respondem pela morte do adolescente na Justiça. O caso está na 1.ª vara Criminal de Bauru, que deve agendar audiência para o depoimento das testemunhas arroladas pelo Ministério Público. Os policiais aguardam o julgamento em liberdade.


Recursos
Os advogados que representam os cinco policiais afirmaram à reportagem que vão tentar reverter a decisão. Sérgio Mangialardo, que defende Gonzaga, Bonini e Ottaviani, afirma que o processo administrativo foi falho. “Várias irregularidades foram cometidas, como o cerceamento de defesa, falta de ciência dos autos e vistas das partes, posto que até agora não temos conhecimento do teor do relatório elaborado”, afirma.

Ele vai além e afirma que a decisão é viciada. “Não reconhecemos a legitimidade do comando da PM, que seguiu um pré-julgamento emitido pelo governador do Estado, que determinou a indenização da família antes de um julgamento”, diz. Mangialardo, afirma que vai recorrer da determinação. “Vamos entrar com as medidas cabíveis para a nulidade do processo administrativo”, conta.

O advogado Wilson Manfrinato Júnior, que representa Ferreira, afirmou que também já estuda a medida que adotará. “Já excluíram todos os recursos. Penso em entrar com mandado de segurança no Tribunal de Justiça Militar, questionando o ato terminal do Comando Geral da PM”, afirma. “O processo administrativo não foi bem desenvolvido e vamos pedir o retorno do Emerson à corporação para que, no mínimo, outro processo seja elaborado”. Para ele, o caso foi “resolvido” rápido demais. “Houve uma celeridade sem igual”, diz. “Uma rapidez sem fronteiras que não permitiria uma avaliação completa do caso”, avalia. “Pressupõe que desde o momento dos fatos já se sabia o destino desses policiais”, afirma.

Gilberto Andriguetto, advogado do soldado Delasta, afirma que recebeu a decisão do Comando da PM com surpresa. “E com certeza iremos entrar com recurso. Vamos adotar a mesma linha que seguimos durante todos o processo e será provada a inocência dele”, afirma.
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Fotos da Caminhada na Batista




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Ao final da caminhada, os participantes reuniram-se na Praça Rui Barbosa, em frente à Catedral:


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quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Mais uma intervenção urbana do GVVDH

17/12/2008 - Jornal da Cidade

Grupo Contra a Violência faz ato em Bauru

Lígia Ligabue


Vestidas de branco, dezenas de pessoas fizeram uma caminhada silenciosa pelo Calçadão da Batista de Carvalho, na noite de ontem. Com faixas, elas protestaram contra o assassinato de mais de 46 mil jovens no País e lembraram o aniversário de um ano da morte do adolescente Carlos Rodrigues Júnior, 15 anos, durante abordagem policial no Núcleo Mary Dota.

A manifestação foi uma iniciativa do Grupo Contra a Violência e Violação dos Direitos Humanos e contou com a presença da família do mecânico Jorge Luiz Lourenço, morto aos 26 anos, em abril de 2006, durante perseguição policial. Os familiares de Rodrigues Júnior não compareceram ao ato.

De acordo com professor Clodoaldo Meneguello Cardoso, da Universidade Estadual Paulista (Unesp), que integra o grupo, a manifestação foi bastante positiva. “Ela foi como esperávamos: um silêncio que contagiou as pessoas que estavam na Batista”, diz. Ele destaca a importância de comemorar os 60 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos e de lembrar dos mais de 46 mil jovens mortos em circunstâncias violentas no Brasil no último ano. “Nem em países em guerra morrem tantos jovens como aqui. E o caso do Carlos Rodrigues Júnior é um exemplo triste e recente disso”, avalia o professor.

A caminhada se encerrou na Praça Rui Barbosa, em frente à Catedral do Divino Espírito Santo, onde os manifestantes acenderam velas.
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Um ano da morte de Carlos Rodrigues Junior

Em dezembro de 2008, lembramos os 60 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Lembramos também, ontem, dia 15, um ano da morte de Carlos Rodrigues Junior, o caso que chocou Bauru, o Brasil e o mundo.

A morte sob tortura de Carlos, 15 anos, teve imensa repercussão nacional e internacional. À época, o governador do Estado declarou que se tratava de uma “brutalidade inaceitável”. O ministro da Secretaria Especial de Direitos Humanos, Paulo Vanucchi, citou o caso em um artigo publicado na Folha de São Paulo. Parlamentares das Comissões de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados e da Assembléia Legislativa vieram a Bauru logo após o ocorrido para apurar os fatos.

O caso consta no relatório de 2008 da Anistia Internacional e, recentemente, foi lembrado no Programa Roda Viva, da TV Cultura, que, em sua última edição, discutiu a temática dos Direitos Humanos.

Nesta semana, André Petry denuncia, em sua coluna na Revista Veja, a impunidade flagrante um ano após a morte do adolescente. Ele lembra que a indenização prometida pelo governador de São Paulo ainda não foi paga à família e que os envolvidos aguardam julgamento em liberdade e continuam integrando os quadros da Polícia Militar. Um ano depois são muitas as reflexões que esse trágico acontecimento nos suscita.

Talvez mais grave que o próprio episódio de tortura e morte de um adolescente de 15 anos em nossa cidade, seja o fato de que alguns setores da sociedade bauruense e brasileira reajam ao ocorrido com uma atitude de banalização ou mesmo - pasmem! - de aprovação. Nada justifica a tortura. Portanto, quem banaliza e aprova a morte desse adolescente, banaliza e aprova a barbárie. Se a sociedade aprova e banaliza a barbárie, estão dadas as condições para que ela se perpetue e se aprofunde.

Em um ano no Brasil, 46.329 jovens foram mortos, em sua grande maioria pobres e negros. Já tivemos em nossa cidade dois casos emblemáticos da violência contra a juventude brasileira: Carlos Rodrigues Junior, 15 anos, e Jorge Luis Lourenço (o Jorginho), 22 anos. Já passa da hora de nos posicionarmos radicalmente contra a violação dos direitos de nossa juventude.

Por isso, nós do Grupo contra a Violência e Violação de Direitos Humanos realizaremos hoje, 16 de dezembro, uma caminhada no Calçadão da Batista, saindo da quadra 1, às 20h, em direção à Praça Rui Barbosa. Convidamos toda a população a participar conosco de mais esse ato público pelo fim da violência.

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