sexta-feira, 4 de junho de 2010

Desclassificação do crime de homicídio doloso no Caso Jorginho gera indignação

O GVVDH repudia a desclassificação do crime de homicídio doloso no caso Jorginho!

Conforme reportagem abaixo, a desclassificação teria se baseado no argumento de que não há comprovações de que os policiais tenham nem mesmo assumido o risco de matar ao efetuar os disparos na direção do rapaz, o que configuraria ao menos dolo eventual.

Como se sabe, contudo, o mecânico Jorge Luiz Lourenço foi morto com nove tiros disparados pelas costas, tendo um deles atingido a cabeça.

Além dos tiros, é preciso lembrar que o local do crime foi alterado, na tentativa de simular que o jovem estava com uma arma na mão direita, o que não se comprovou, já que Jorginho era canhoto.

O GVVDH realizou o ato de protesto "Justiça para o caso Jorginho" no dia 25 de fevereiro de 2010 em frente ao Fórum da cidade, manifestando-se contrário à possibilidade de que o caso não vá a juri popular. Na ocasião foram distribuídos à população panfletos com os seguintes dizeres:

Jorginho foi assassinado no dia 05 de abril de 2007 após furar um bloqueio policial quando voltava do trabalho para casa. Nove tiros foram disparados contra Jorginho. Um deles atingiu a cabeça.
Ficou comprovado que a cena do crime foi modificada: uma arma foi colocada na mão direita de Jorginho para acusá-lo falsamente de estar armado e ter entrado em confronto com a polícia. Mas a mentira não foi longe: Jorginho era canhoto.

Os policiais envolvidos foram expulsos da Corporação. Mas agora o Promotor requeriu a desclassificação do crime de homicídio doloso para culposo. Isso significa que não teria havido intenção de matar. Mas, pense nisso: quem atira nove vezes pelas costas não tem intenção de matar?

Confira a reportagem publicada no Jornal da Cidade noticiando a desclassificação:

01/06/2010 - Polícia

‘Caso Jorginho’ não irá a júri popular

Em sentença publicada ontem, juiz da 1.ª Vara Criminal diz que morte de mecânico não configura homicídio doloso

Tisa Moraes e Ieda Rodrigues Com Redação



Em sentença publicada ontem, o juiz de direito da 1ª Vara Criminal de Bauru, Benedito Antônio Okuno, decidiu pela desclassificação do crime de homicídio doloso no caso da morte do mecânico Jorge Luiz Lourenço, o Jorginho. Ele foi baleado durante perseguição da Polícia Militar (PM) ocorrida em abril de 2007, no Núcleo Mary Dota.

Com isso, os réus, os então policiais militares Lincoln César Cares, Renato Valderramas De Favari e Ricardo Antônio do Amaral, não deverão ser mais levados a júri popular. Embora Okuno não tenha especificado por qual crime os acusados serão julgados, especialistas consultados pelo JC acreditam que eles deverão responder por homicídio culposo (sem intenção de matar), cuja pena não ultrapassa três anos de detenção, se não for considerada nenhuma circunstância agravante.

Ainda de acordo com essas fontes, com a decisão, o processo deverá ser novamente distribuído para uma das quatro varas criminais de Bauru. Mais uma vez, o juiz a se encarregar do caso deverá pedir nova manifestação do Ministério Público e só então poderá tipificar o crime e decidir qual a pena a ser aplicada.

Ele também terá de considerar o recurso da acusação, já que a família de Lourenço adiantou que pedirá para que a decisão seja reformada. Já os advogados de defesa esperam que o processo possa ser julgado no Tribunal de Justiça Militar, mas a reportagem apurou que a probabilidade de que essa mudança ocorra é praticamente nula.

A decisão do juiz da 1ª Vara Criminal foi baseada na consideração final do Ministério Público (MP) - que em fevereiro, solicitou que o policiais envolvidos no processos respondessem por homicídio culposo - e também nos depoimentos de testemunhas e peritos. Inicialmente, no entanto, o caso havia sido denunciado como homicídio doloso, já que Lourenço supostamente estaria desarmado e não teria tido oportunidade de defesa.

Mas a sentença assinada por Okuno concordou com a avaliação do promotor Djalma Marinho Cunha Filho de que não há comprovações nem de que os policiais tenham assumido o risco de matar ao efetuar os disparos na direção do rapaz. Mesmo se isso tivesse acontecido, a Promotoria não poderia afirmar que agiram em conjunto e nem com dolo eventual, já que não foi possível determinar quem foi o autor do disparo fatal.

“Somente aquele que atingiu a vítima poderia ter agido com dolo eventual. Com a autoria incerta, não há como fundamentar a pronúncia de todos os réus”, escreveu o juiz. “O dolo eventual consiste em assumir o risco de produzir o resultado, mas quem está em serviço, praticando atos típicos de seu trabalho, age com dolo eventual? Salvo melhor juízo, entendo que não”, acrescentou.


'Provocação da vítima'

Na sentença, o juiz Benedito Okuno afirma que ficou evidente que os acusados pelo crime não tiveram intenção de matar e efetuaram os disparos “por provocação da vítima, em razão de sua fuga”, na tentativa de intimidar Jorge Luiz Lourenço. Defendeu também que os policiais estavam em serviço e que, diante do ocorrido, era dever legal deles “agir e atirar”.

Para ele, quem assumiu o risco de ser morto foi o próprio mecânico, que fugiu “de forma cinematográfica”. O juiz lembra que, no dia do homicídio, ficou constatado que houve fuga de presos do Instituto Penal Agrícola (IPA), na qual os detentos tiveram auxílio de motociclistas. Dentro desse contexto, Lincoln, Amaral e Favari se depararam com Lourenço no cruzamento da avenida Nuno de Assis com a rua Araújo Leite. Ainda de acordo com o texto, a placa do veículo do mecânico estava dobrada e os faróis apagados. Ele não teria parado após a ordem dos PMs, desrespeitando sinalizações e dois bloqueios.

Em uma estrada de terra, os policiais teriam visto lampejos de luz vindos da direção onde Lourenço estava e, por esse motivo, dispararam nesta direção, acertando a vítima uma vez na cabeça. Ao perceberem que o mecânico tinha sido atingido, o levaram na viatura ao Pronto-Socorro Central, onde ele morreu.

O juiz avaliou que, apesar de ainda existirem dúvidas sobre a arma encontrada próxima ao local onde Lourenço foi alvejado, além do laudo residuográfico ter apontado que havia esfregaços e não micropontos de chumbo em sua mão direita, sendo que o mecânico que era canhoto, os outros elementos comprobatórios apontam para essa situação. Para o juiz, o mecânico poderia ter provocado o esfregaço em seu trabalho.

Também afirmou que “o fato de ter sido atingido por trás não significa que estava em fuga e não teria como efetuar os disparos”. Conforme laudos e fotos, o tiro teria atingido Lourenço na lateral esquerda da cabeça, posição que, de acordo com Okuno, pode ser possível “em uma troca de tiros, dependendo do movimento de cabeça da vítima”, consta em sua sentença.


Acusação vai recorrer

Informado pela reportagem de que o juiz Benedito Okuno, da 1.ª Vara Criminal de Bauru, entendeu que os então policiais militares Lincoln César Cares, Renato Valderramas De Favari e Ricardo Antônio do Amaral não sejam julgados por júri popular porque não agiram com a intenção de matar o mecânico Jorge Luiz Lourenço, em abril de 2007, o advogado da família do mecânico adiantou que vai recorrer. Em nota, o escritório Sérgio Ribeiro Sociedade de Advogados, que defende a família, diz que no processo há, sim, provas de que os policiais tinham a intenção de matar.

“No entendimento da família, esta sentença, que acaba inocentando os ex-policiais, vai contra as provas que estão nos autos. As provas periciais são incontestáveis. Para a família, foi homicídio doloso (com a intenção de matar) e houve fraude processual. A família vai apelar ao Tribunal para que a decisão seja reformada e que os ex-policiais, que já foram expulsos da Polícia Militar, sejam julgados pelo Tribunal do Júri”, diz a nota.


Defesa espera absolvição

Após a sentença do juiz Benedito Okuno, da 1.ª Vara Criminal de Bauru, que os então policiais militares Lincoln César Cares, Renato Valderramas De Favari e Ricardo Antônio do Amaral não sejam julgados pelo Tribunal do Júri porque não agiram com a intenção de matar o mecânico Jorge Luiz Lourenço em abril de 2007, a advogada dos réus espera que o caso retorne à Justiça Militar e que os quatro sejam absolvidos.

Informada sobre a decisão pela reportagem, a advogada Fernanda Cabello da Silva Magalhães afirma que no processo não havia provas que os acusados agiram com a intenção de matar.

Apesar de o juiz ainda não ter escrito na sentença que o caso retorne à Justiça Militar, caso a decisão não seja reformada há chance de os réus serem julgados pelo Tribunal de Justiça Militar por homicídio culposo (sem a intenção de matar). E é aí que a defesa dos então policiais espera que a conclusão seja de que agiram no estrito dever da profissão e em legítima defesa.

Se esta for a decisão, os acusados poderão, inclusive, reivindicar a reincorporação à Polícia Militar. Na defesa, a advogada argumenta que os réus agiram no estrito cumprimento do dever legal e em legítima defesa. Ressaltando que o terreno onde o mecânico entrou na fuga e foi morto, um matagal no Mary Dota, é em declive, a defesa afirma que ele poderia ver os policiais e os policiais não poderiam vê-lo.

Sobre a acusação de fraude processual, pois o mecânico apresentava resquícios de chumbo na mão direita, quando era canhoto, e não na esquerda, a defesa argumenta que o exame residuográfico é de orientação, não de certeza.

A defesa dos acusados aponta, ainda, que todos, em depoimentos separados, apresentaram versões semelhantes para o caso.

Um comentário:

  1. Embora eu não conheça minúcias do presente caso e, ainda, milite na defesa em processos criminais, entendo que a r. sentença é no mínimo ABSURDA.
    Ouso chamar de absurda a sentença porque, segundo as notícias divulgadas, a decisão convalida arbitrariedade e abuso de autoridade, práticas infelizmente corriqueiras a alguns milicianos.
    Ainda, questiono: caso a vítima fosse policial militar e o seu algoz um mecânico, será que a decisão seria pela desclassificação do homicídio doloso para o homicídio culposo?

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