quinta-feira, 24 de junho de 2010

Promotor da Infância e Juventude emite parecer contrário ao toque de recolher!

Jornal da Cidade - 24/06/2010

Promotor é contra toque de recolher

Lucas Pimentel emitiu, ontem, parecer contrário ao pedido feito recentemente em audiência; juiz dará palavra final

por Tisa Moraes

O promotor da Infância e Juventude, Lucas Pimentel de Oliveira, emitiu, ontem, parecer contrário ao pedido de implantação do toque de recolher em Bauru. Ainda hoje, a manifestação será enviada ao juiz da Vara da Infância e Juventude, Ubirajara Maintinguer, que irá tomar a decisão final sobre o tema, o que deverá ocorrer dentro dos próximos dez dias.

A proposta foi apresentada no início de abril pelo comandante do 4º Batalhão da Polícia Militar do Interior (4º BPMI), tenente-coronel Nelson Garcia Filho. Ele sugere a proibição da presença de menores de 18 anos nas vias públicas e estabelecimentos comerciais de segunda a sexta-feira, depois das 23h, e aos sábados, domingos e feriados, após a meia-noite. O principal objetivo seria deter a criminalidade juvenil e proteger os jovens de perigos como o crack, que já se tornou questão de saúde pública.

A iniciativa foi discutida amplamente nos meses que se seguiram, principalmente entre os órgãos e instituições de defesa dos direitos da criança e do adolescente. No final de maio, Maintinguer promoveu uma audiência pública para que ele e o Ministério Público (MP) tomassem conhecimento do debate gerado pelos representantes da área.

Desde o início, entidades como o Conselho Tutelar, Conselho Municipal dos Direitos da Criança, Secretaria Municipal do Bem-Estar Social (Sebes), Conselho Regional de Psicologia (CRP), Polícia Civil e Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) se manifestaram contra a adoção da medida. E esse posicionamento, segundo Pimentel, pesou em sua manifestação contrária ao projeto.

“Não há uma legitimação social para a proposta, na medida em que não tem o apoio dos segmentos constituídos. Na audiência pública, além da Polícia Militar, apenas dois Consegs (Conselhos Comunitários de Segurança) foram favoráveis.”

De acordo com o promotor, o toque de recolher fere alguns dispositivos da Constituição Federal, dentre eles a dignidade da pessoa humana e os direitos de locomoção e reunião. “E a Constituição só permite a restrição desses direitos nos denominados estados de defesa e sítio. No meu modo de ver, não teria como o juiz determinar essa limitação por uma norma geral, que atinge a todos os adolescentes indistintamente”, aponta.

Os artigos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) relacionados ao direito à convivência comunitária também foram considerados por Pimentel. “Se o adolescente não pode sair na rua em determinados dias e horários, não poderia brincar ou interagir com os seus pares na frente de casa.”


‘Ineficaz’

Afora todos os entraves legais para que o toque de recolher possa ser aplicado, o promotor afirma ainda que a medida, por si só, é ineficaz como estratégia para combater o consumo de álcool e drogas, assim como controlar o aliciamento de jovens para o tráfico e a prostituição. Para ele, estes são problemas que precisam ser enfrentados de forma ampla, com o desenvolvimento de políticas públicas que envolvam os segmentos políticos e sociais responsáveis.

“Não podemos trancar esses adolescentes em suas casas. Não podemos presumir que em todo lugar, a todo momento, haverá um bandido querendo pegas as crianças e adolescentes. A obrigação de criar, orientar e impor limites aos filhos é dos pais, sem a interferência, num primeiro momento, do Poder Judiciário”, frisa.

Embora o parecer do promotor seja importante para nortear a decisão do juiz da Vara da Infância e Juventude, o tenente-coronel Garcia ainda tem esperanças de que o toque de recolher possa ser adotado em Bauru. Mesmo que a proposta inicial não seja aceita, ele acredita que algumas modificações nas regras sugeridas possam aumentar as chances de a iniciativa ser posta em prática.

“Poderia, por exemplo, estender o horário (aos sábados, domingos e feriados) para as 2h. Ainda acho que a aprovação é possível, principalmente se dermos voz aos pais de crianças e adolescentes, que em sua maioria apoiam a proposta, mas que tiveram pouca oportunidade de serem ouvidos neste processo”, pondera.
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