Redução da idade penal: redução da violência?
Um dos principais argumentos dos defensores e simpatizantes da redução da idade penal no Brasil é a suposição de que essa medida contribuiria para a redução da violência no país. O raciocínio parece ser o seguinte: o adolescente comete atos infracionais porque sabe que não vai para a “cadeia” por ser “de menor”.
Estivesse correta essa explicação, poderíamos supor que, ao completar 18 anos, o medo de ir para a “cadeia” levaria o jovem a se afastar da criminalidade. Mas os adolescentes são responsáveis por apenas 4% do total de crimes no Estado de São Paulo, segundo levantamento da Secretaria de Segurança Pública divulgado no final de 2003. Como então explicar que os adultos cometam (proporcionalmente) muito mais crimes e crimes mais graves mesmo sabendo que estão sujeitos ao Código Penal? Ou ainda: como explicar que a maior parcela de presidiários no país se encontre na faixa dos 18 aos 29 anos (60% da população carcerária, segundo dados do IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada)?
A conclusão possível é que o fato de atingir a idade penal (18 anos) e a possibilidade de ir para a “cadeia” - e não mais para a medida sócio-educativa de internação - por si só não afastam o jovem da criminalidade. Sendo assim, cabe perguntar: seria a redução da idade penal uma solução mágica para a violência no país ou apenas uma “solução” ilusória?
Esse é um debate bastante complexo e essa é apenas uma de suas dimensões. Nós, contrários à redução da maioridade penal, também defendemos e cobramos do poder público o combate à violência. Mas desejamos um combate efetivo às causas da violência e sabemos que a redução da idade penal não traria esse efeito.
Nada justifica a violência, mas ela precisa ser explicada. E a compreensão e o combate às causas da violência cometida por adolescentes exigem que abandonemos as explicações simplistas do fenômeno e busquemos compreender os diversos fatores envolvidos na gênese do ato infracional.
É preciso, pois, que analisemos as condições de vida e educação que temos oferecido aos nossos adolescentes; a qualidade das relações humanas que têm estado na base de sua formação como indivíduos; a qualidade dos vínculos afetivos que têm se estabelecido entre o adolescente e as pessoas a sua volta; as suas reais possibilidades de inserção social e de construção de um projeto de vida em uma estrutura social desigual, injusta e excludente. É preciso que nos perguntemos se temos garantido seus direitos fundamentais (educação, saúde, lazer, cultura, profissionalização) - ou sistematicamente os violado.
Intervindo nesses aspectos poderemos realizar um combate efetivo à violência, pois estaremos transformando as condições de formação, de desenvolvimento humano e de vida dos indivíduos. Um grande filósofo alemão nos ensinou - genialmente - já em meados do século XIX, que “se o homem é formado pelas circunstâncias, é preciso formar as circunstâncias humanamente”. Cabe a nós a tarefa de (trans)formar humanamente as circunstâncias nas quais se formam nossas crianças e adolescentes e nos formamos a nós mesmos.
A autora, Juliana C. Pasqualini, é psicóloga e professora, doutoranda em Educação Escolar pela Unesp - Araraquara, membro da Comissão de Criança e Adolescente do Conselho Regional de Psicologia (CRP) - Subsede Bauru
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