Ato vira marco para direitos humanos
A celebração do 1.º ano da morte do mecânico Jorge Luiz Lourenço, ontem no Mary Dota, cobrou Justiça e democracia
No local, emoção e política mais uma vez se uniram na tentativa de transformar o caso num novo marco dos direitos humanos em Bauru.
O mecânico morreu dia 5 de abril do ano passado com um tiro na cabeça, numa ação da Polícia Militar.
“Existe uma cultura autoritária no País. É histórica e foi nutrida. Ela ainda está enraizada, embora tenhamos uma democracia institucional”, disse o professor da Universidade Estadual Paulista (Unesp), Clodoaldo Meneguello Cardoso, integrante do Grupo Contra a Violência e Violação dos Direitos Humanos.
Em sua fala, ele ressaltou que tratava-se de uma celebração religiosa, cívica e política. “A ação política se dá quando os cidadãos estão pensando a cidade. Esses dois casos no Mary Dota não estão soltos. Existe a idéia de que o pobre é culpado”, discursou. De acordo com ele, se Jorge tivesse sido abordado nos Altos da Cidade, o final da história poderia ser outro.
Ele defende que jovens de periferia se reúnam e se organizem na busca de um bairro melhor e de uma nova sociedade. “A construção da paz é coletiva e organizada”, falou para os presentes, que somavam umas 60 pessoas, todas emocionadas.
A psicóloga Juliana Pasqualini, também integrante do grupo, mal conseguiu encerrar o evento. Sua fala foi embargada e interrompida várias vezes.
Emoção
“O ato é para lembrar dele e demonstrar que a sociedade não aceita mais isso, com a expectativa que a gente não volte mais a assistir a coisas do tipo”, informou. Participaram do ato ecumênico um representante da umbanda, um missionário evangélico e um católico. Muitos vestiam camiseta com a foto do mecânico e os dizeres ”lembre-se que estar com raiva não lhe dá o direito de ser cruel”.
Após as manifestações religiosas, um ipê-branco foi plantado no canteiro central da avenida Marcos de Paula Raphael.
Enquanto os pais do mecânico, Edite e Jorge, acompanhavam o plantio, a mãe e a irmã do adolescente Carlos Rodrigues Júnior, torturado e morto pela PM também no ano passado, mal conseguiam falar de emoção. “As pessoas precisam se conscientizar da gravidade do que aconteceu”, pronunciou Débora Rodrigues.
Na seqüência, ela acompanhou as palavras de Edite Lourenço, que levou ao ato o caderno onde registra textos de seu agrado. Leu um deles para o filho. “Teu nome não sai da minha boca; em cada rosto te visualizo, filho”, diziam alguns trechos. Segundo ela, a vida passou arrastada no último ano, como ela já imaginava. “Com o passar dos dias, vai piorando, ainda mais da forma como ele foi tirado de mim. Preciso de Justiça. É uma dor sem fim, o tempo nunca vai amenizar”, conclui.
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Relembre o caso
Na noite do dia 5 de abril de 2007, o mecânico Jorge Luiz Lourenço pilotava uma Falcon vermelha com a placa virada. Quando se deparou com a PM, fugiu em alta velocidade. Foi perseguido e baleado na cabeça num matagal ao lado da avenida Rosa Malandrino Mondelli, no Núcleo Habitacional Mary Dota.Um mês depois, os três policiais militares envolvidos no caso foram indiciados por homicídio em inquérito instaurado pela própria corporação. Segundo o relatório do inquérito policial militar, a cena do crime ainda teria sido forjada pelos policiais.O Ministério Público também ofereceu denúncia contra os três, embora no inquérito da Polícia Civil, apenas dois tenham sido indiciados. Atualmente, eles trabalham administrativamente na corporação. Hoje à tarde, a PM ouvirá o testemunho da moça que emprestou o capacete ao mecânico e do pai dele, a pedido da defesa dos policiais. “Apesar da fatalidade da morte dele, a defesa continua com a mesma linha de trabalho no sentido de que os policiais são inocentes”, explica a advogada Fernanda Cabello da Silva Magalhães.
Luciana La Fortezza
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